Boa vontade e pacificações no novo ano

Boa vontade e pacificações no novo ano

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Ano Novo!… Pede ao Céu Que te proteja o trabalho, Que te conceda na fé O mais sublime agasalho. Casimiro Cunha

(Xavier, Francisco Cândido. Espírito Casimiro Cunha. Cartas do Evangelho. São Paulo: Lake).

As passagens para um novo ano sempre motivaram o homem e geralmente ensejam esperanças de melhorias e expectativas de num mundo melhor.

Na realidade, um novo ano é uma mudança formal no calendário e naturalmente, na prática, é uma sequência de fatos e compromissos que vêm se desenrolando.

Os três últimos anos foram assinalados pela terrível pandemia do COVID-19, gerando momentos distanciamento social e vários tipos de crises. Em nível global há expectativas para que seja assegurado o controle da pandemia, a cessação de guerras e um cenário propício para um ambiente de pacificação geral nas relações pessoais e sociais.

No contexto social há necessidade de caminhos para soluções nas áreas políticas, econômicas, sociais, educacionais, de saúde, e, sem dúvida, com repercussões no próprio movimento espírita, que faz parte da sociedade. Em todos os cenários, são homens encarnados os responsáveis pelas decisões e ações e vale a pena se recordar da obra “A Gênese”, de Allan Kardec, que no Cap. I encontra-se o registro: “Numa palavra, o que caracteriza a revelação espírita é o ser divina a sua origem e da iniciativa dos Espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem”. Nessa mesma obra de Kardec, no Cap. XVIII, há considerações sobre a longa etapa que vivemos, os “Sinais dos tempos”. O Codificador destaca: “A fraternidade será a pedra angular da nova ordem social; mas, não há fraternidade real, sólida, efetiva, senão assente em base inabalável e essa base é a fé, não a fé em tais ou tais dogmas particulares, que mudam com os tempos e os povos e que mutuamente se apedrejam, porquanto, anatematizando-se uns aos outros, alimentam o antagonismo, mas a fé nos princípios fundamentais que toda a gente pode aceitar e aceitará: Deus, a alma, o futuro, o progresso individual indefinito, a perpetuidade das relações entre os seres.”

Para o Espiritismo fica claro que o livre-arbítrio e o real compromisso de aprimoramento moral e espiritual dos homens estão na base das esperadas transformações que poderão se fortalecer num novo e melhor ano.

A propósito, recordamos da pioneira psicografia de Chico Xavier sobre união: “Em nome do Evangelho” (Emmanuel, 1948), de onde destacamos os trechos:

“O mundo conturbado pede, efetivamente, ação transformadora. […] unamo-nos no mesmo roteiro de amor, trabalho, auxílio, educação, solidariedade, valor e sacrifício que caracterizou a atitude do Cristo em comunhão com os homens, servindo e esperando o futuro, em seu exemplo de abnegação, para que todos sejamos um…” (Carvalho, Antonio Cesar Perri. Emmanuel. Trajetória espiritual e atuação com Chico Xavier. O Clarim).

Nesse “mundo conturbado”, deve haver esforço para a disseminação do roteiro preconizado pelo Cristo, inclusive com o empenho dos espíritas. É o apelo para os “homens de boa vontade” com que os espíritos anunciaram as “novas de grande alegria” por ocasião do nascimento de Jesus (Lucas 2: 10, 14).

Que o ano novo seja melhor para todos nós!

Significados: nascimento de Jesus, magos e presépio

Significados: nascimento de Jesus, magos e presépio

     

 

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Em obra recém editada reunindo conteúdos transcritos dos programas radiofônicos “No limiar do amanhã” de Herculano Pires, dispõe-se de esclarecimentos em nível simples sobre temas fundamentados nos Evangelhos (*). Entre esses programas vários estão relacionados com o episódio do nascimento de Jesus.

José Herculano Pires (1914-1979) foi um marcante vulto paulista, jornalista, destacado filósofo espírita, autor de dezenas de livros, tradutor de obras de Allan Kardec, palestrante, ativo e combativo líder espírita.

Ao analisar o contexto dos dias do nascimento de Jesus em programas radiofônicos, Herculano Pires recorda o registro sobre recenseamento realizado pelo Império Romano, com finalidade de cobrança de impostos, e a obrigatoriedade que as pessoas se dirigissem para as cidades troncos de cada família. Comenta que José e Maria eram pobres, foram a pé de Nazaré até Belém e encontraram a cidade lotada e não haveria outro recurso senão ir para um estábulo e “isso não era humilhante, absolutamente. Isso era um costume perfeitamente adequado aos tempos”.

Num dos programas radiofônicos, Herculano responde sobre Maria: “quando tratamos do nascimento de Jesus, e Maria nos é apresentada como a virgem mãe, “é preciso nos lembrarmos de que em toda Antiguidade existiram numerosas virgens mães” e tece considerações sobre as explicações mitológicas sobre esse assunto. Também cita o apóstolo Paulo: “ele veio sob a lei e nasceu de mulher” e Herculano opina: “o nascimento de Jesus foi normal, ele era filho de Maria e José. A influência do Espírito Santo nada mais é do que a presença de sua grandeza espiritual. O Espírito Santo é o espírito puro e Jesus era um espírito puro. Assim, como disse o apóstolo Paulo, o nascimento de Jesus foi um nascimento normal, sob a lei e ele nasceu de mulher”.

A respeito da visita dos reis magos, cita a expressão empregada por Mateus: “vieram uns magos do oriente” e comenta: “os magos vieram do oriente para visitar Jesus, mas se eram reis ou não, isso não podemos saber”. Não há registro histórico sobre isso.

Quanto aos presentes ofertados pelos magos, começa por considerar que os magos não seriam entendidos “no sentido atual da palavra, mágicos ou pessoas que têm certas habilidades manuais”, seriam “conhecedores dos segredos da natureza”. Passa a analisar o sentido dos presentes dos magos: “eles interpretaram em três elementos em três formas de oferta, toda vida, todo destino do menino que estava nascendo”. E conclui Herculano: “o menino Jesus haveria de enfrentar o ouro do mundo. Desenvolver em si a adoração a Deus na simbologia do incenso, e, por fim, sofrer o sacrifício supremo na simbologia da mirra. Esse é o sentido que vemos na oferta dos magos”.

Por outro lado, todo o cenário do nascimento de Jesus ficou assinalado pela tradição dos presépios. Em um programa Herculano respondeu a radiouvinte lembrando que a origem do presépio é devida a Francisco de Assis: “Ele queria dar assim uma imagem clara, didática, que ensinasse aqueles que olhassem para essa imagem, a grande lição de humildade de Jesus em seu nascimento”.

Os capítulos dessa oportuna obra contendo as transcrições de centenas de gravações de programas radiofônicos de Herculano Pires trazem à tona oportunas e profundas análises do preclaro expositor e autor espírita. Em várias outras obras Herculano Pires tece considerações abalizadas a propósito da visão espírita sobre a trajetória do cristianismo.

Em síntese, sobre o episódio do nascimento de Jesus e seu significado para a Humanidade, destacamos que Herculano lembra explicações de filólogos que “o nome ‘Jesus’ e ‘Yeshua’ em hebraico queria dizer ‘Iavé salva’, ou seja “Deus salva’.”

Em outra parte, relacionando com o cenário do nascimento, o autor analisa o significado de o Cristo ter escolhido a condição humilde: “Colocando-se entre os humildes, os pobres, os deserdados da fortuna, aqueles que não tinham o poder nas mãos e viviam mesmo em situação difícil, o Cristo se colocava como um representante de uma ordem social nova que devia aparecer no mundo. Essa ordem decorrer dos princípios mesmo do cristianismo, de seus ensinos constantes no Evangelho…”

E Herculano Pires conclui: “Portanto, o nascimento do Cristo na humildade, na condição de uma criatura desprovida de todos os poderes humanos, tinha por finalidade mostrar que ele vinha à Terra como um verdadeiro enviado do céu, apoiado apenas na riqueza celeste, que é o poder do espírito”.

Essas anotações são sugestivas para reflexões ao ensejo das comemorações do nascimento de Jesus.

(*) Pires, José Herculano; Garcia, Wilson (Org.). No limiar do amanhã: conversa sobre a Bíblia, os evangelhos, o espiritismo. Livro 2. São Paulo: Paideia. 2021. 277p.

União, divulgação e intercâmbio assinalam comemorações de Araçatuba

União, divulgação e intercâmbio assinalam comemorações de Araçatuba

         

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Araçatuba foi fundada em 02/12/1908 com a instalação da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (NOB). O nascente povoado recebeu os operários e engenheiros da Estrada de Ferro, os primeiros comerciantes e agricultores.

Entre esses chegaram os pioneiros espíritas da cidade.

No ano de 1914, Gedeão Fernandes de Miranda se estabeleceu como agricultor. Tornou-se espírita na mesma época e no ano de 1921 veio a ser o fundador da primeira instituição espírita da cidade, a União Espírita Paz e Caridade, em pleno funcionamento em nossos dias e mantendo o Abrigo Ismael.

Também em 1914, o italiano Umberto Bergamaschi aportou na nascente cidade como agrimensor. Ele e descendentes atuaram em vários centros espíritas de Araçatuba.

Outro italiano, Ugolino Dall’Oca, chegou no ano de 1916 para atuar no comércio e juntamente com sua família vieram a atuar em várias instituições, inclusive na fundação de mocidade espírita e entidade assistencial na cidade.

O movimento espírita desenvolveu-se com atuação de notáveis líderes e a fundação de várias e diversificadas instituições.

No contexto de organização da união dos espíritas em nível estadual, em 1947, foi fundada na capital paulista a União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo, prevendo-se a instalação de órgãos em níveis municipal e regional. Assim, foi criada a União Municipal Espírita de Araçatuba, em 1949, e, em 1952, a cidade tornou-se sede de um Conselho Regional Espírita. Esses órgãos de união dos espíritas atualmente são designados, respectivamente, USE Intermunicipal de Araçatuba e USE Regional de Araçatuba.

A efeméride dos 70 anos de criação da USE Regional de Araçatuba foi focalizada no domingo, dia 04 de dezembro, em evento virtual da Confraternização de Espíritas da Alta Noroeste, transmitida pelo canal Estação Dama Caridade Benedita Fernandes.

Como convidado e ex-dirigente espírita da cidade, desenvolvemos o tema “União com divulgação e intercâmbio”. Nossa exposição foi dividida em três blocos: a origem da USE Regional em 1952, na época o Conselho Regional Espírita; a criação da CONEAN – Confraternização de Espíritas da Alta Noroeste em 1981; e considerações sobre as atividades espíritas na atualidade. Nos dois primeiros blocos, apresentamos fotos históricas.

Esses blocos foram entremeados com relatos de dirigentes espíritas da região, desenvolvidas em Auriflama, Guararapes, Biriguí, Penápolis e Araçatuba.

Ao final falaram ex-dirigentes da USE Regional de Araçatuba: Maria Luzia de Almeida Rosa, Osvaldo Magro Filho, Ismael Gobbo, Dirceu Semighini e Sirlei Nogueira. O atual presidente Roberto Cesar Santos fez a coordenação da programação e também teceu as considerações finais.

Num panorama rápido sobre o desenvolvimento do Espiritismo em Araçatuba nos chamam atenção alguns fatos relacionados com o tema do citado evento virtual. Desde a origem da cidade já apareciam pioneiros espíritas e dois sendo imigrantes. Ainda nas décadas iniciais, uma afrodescendente, Benedita Fernandes, foi pioneira na cidade e região nas atividades assistenciais espíritas. Com a “Jornada sobre Mediunidade”, a partir de Araçatuba, houve a propagação do programa de estudo e prática da mediunidade – COEM, originário do Centro Espírita Luz Eterna, de Curitiba. Entre variadas formas de divulgação implantadas no movimento espírita da cidade, destaca-se a instalação de antena retransmissora da TV Mundo Maior (TV aberta da FEAL), em 2017.

Ou seja, há diversos marcos representativos das palavras chaves: união, divulgação, intercâmbio.

A mensagem espírita, com união e intercâmbio entre instituições, é importante para se fortalecer as propostas de acolhimento e apoio a todos que adentram as instituições espíritas.

(*) Foi dirigente espírita em Araçatuba, presidente da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo e da Federação Espírita Brasileira 

Live – acesse pelo link (copie e cole): https://www.youtube.com/watch?v=EJBa7KVRFIQ&t=1745s

Os ensinamentos da obra Paulo e Estêvão

Os ensinamentos da obra Paulo e Estêvão

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Há 80 anos, em julho de 1942, a literatura espírita foi enriquecida com o lançamento do romance Paulo e Estêvão, a magistral obra psicografada por Francisco Cândido Xavier, de autoria do espírito Emmanuel.1

Esse romance marcante foi psicografado por Chico Xavier ao longo de poucos meses, numa pequena sala, cedida ao médium, da casa do administrador Rômulo Joviano no ambiente bucólico da Fazenda Modelo, em Pedro Leopoldo (MG). Emmanuel concluiu e redigiu a apresentação no dia 08/07/1941.1

Emmanuel detalha Atos e as Epístolas de Paulo focalizando a saga do doutor Saulo de Tarso, autoridade na Lei Mosaica, que ao iniciar seu processo de transformação no Apóstolo do Cristo, foi submetido pelos seus antigos pares e até por seguidores do Cristo, a constrangimentos e dificuldades. Saulo de Tarso era o “vaso preparado” para a espinhosa missão, pois era detentor da chamada “autonomia intelectual” advinda das condições excepcionais de sua preparação, de vivência em três mundos: lar de tradição judaica, cultura helênica da terra natal Tarso, imerso no império romano e detentor da cidadania romana.2

De início, realçamos os objetivos de Emmanuel para a elaboração de Paulo e Estêvão:

“[…] para atingir os fins a que nos propomos, transferindo ao papel humano, com os recursos possíveis, alguma coisa das tradições do plano espiritual acerca dos trabalhos confiados ao grande amigo dos gentios. […] não é nosso propósito levantar apenas uma biografia romanceada. […] Nosso melhor e mais sincero desejo é recordar as lutas acerbas e os ásperos testemunhos de um coração extraordinário, que se levantou das lutas humanas para seguir os passos do Mestre, num esforço incessante. […] Paulo de Tarso foi um homem intrépido e sincero, caminhando entre as sombras do mundo, ao encontro do Mestre que se fizera ouvir nas encruzilhadas da sua vida.”1

A homenagem a Estêvão – primeiro mártir do Cristianismo e vítima do outrora doutor Saulo -, também é esclarecida por Emmanuel: “Outra finalidade deste esforço humilde é reconhecer que o Apóstolo não poderia chegar a essa possibilidade, em ação isolada no mundo. Sem Estevão, não teríamos Paulo de Tarso. […] A contribuição de Estevão e de outras personagens desta história real vem confirmar a necessidade e a universalidade da lei de cooperação. […] sem cooperação, não poderia existir amor; e o amor é a força de Deus, que equilibra o Universo”.1

O sacrifício de Estêvão e o rompimento de Saulo com sua noiva Abigail foram fatores predisponentes para que algum tempo depois capitulasse o destemido perseguidor dos seguidores de Jesus. Episódio ímpar é que teve a honra de ser procurado pelo próprio Jesus: “Saulo, Saulo, por que me persegues?”1

Paulo, como principal divulgador da mensagem do Mestre, fundou em muitos locais as chamadas igrejas cristãs (ecclesia - local de reunião, atualmente significando “igreja”). O autor espiritual detalha os primeiros labores apostólicos, a fidelidade que o ex-doutor da Lei tinha Moisés, transferindo-a para Jesus, não aceitando as interferências judaizantes e as polêmicas sobre limites à abrangência do trabalho e da difusão da mensagem da Boa Nova.2

[…] Outra ação histórica em termos de registro do Cristianismo primitivo foram as Epístolas e, numa meditação noturna, recebe a seguinte orientação: “Não te atormentes com as necessidades do serviço. É natural que não possas assistir pessoalmente a todos, ao mesmo tempo […] Poderás resolver o problema escrevendo a todos os irmãos em meu nome; […] Doravante, Estêvão permanecerá mais aconchegado a ti, transmitindo-te meus pensamentos…”1

Daí o título da obra de Emmanuel, destacando o Apóstolo e o primeiro mártir do Cristianismo, Estêvão, na posição de seu orientador espiritual para a difusão do Cristianismo. Paulo, nos momentos mais adversos de sua vida, nunca deixou de divulgar a mensagem de Jesus. Mesmo nos momentos em que esteve preso, redigiu Epístolas e orientou Lucas na elaboração de Atos dos Apóstolos. Uma das últimas “epístolas da prisão”, a 2a Epístola a Timóteo contém um comentário que resume a vida e ação do apóstolo Paulo: “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé”.

Nas Epístolas há referências à prática da mediunidade, realçada por Emmanuel em vários trechos do romance, como: “O mediunismo evangelizado dos tempos modernos é o mesmo profetismo das Igrejas apostólicas”.1

[…] Extremamente significativo é o registro sobre o cenário espiritual da comunidade de Antioquia: “Vivia-se ali num ambiente de simplicidade pura, sem qualquer preocupação com as disposições rigoristas do judaísmo.”

Em outro trecho, anota: “A união de pensamentos em torno de um só objetivo dava ensejo a formosas manifestações de espiritualidade. Em noites determinadas, havia fenômenos de “vozes diretas”. A instituição de Antioquia foi um dos raros centros apostólicos onde semelhantes manifestações chegaram a atingir culminância indefinível. A fraternidade reinante justificava essa concessão do Céu.”1

A nosso ver, na atualidade, há necessidade de se analisar e rever questões como a excessiva formalização e escolarização que ocorrem nos centros espíritas, provocando um certo "engessamento" da mediunidade… Deve haver prudência para a criação de estruturas e atividades que poderiam ser típicas de uma organização administrativa e doutrinária mais complexa. Na realidade, boa parte dos centros não dispõem dos chamados "departamentos" e nem teriam condições de recursos humanos para montá-los.3

Os centros espíritas, sendo menos formais e mais voltados à solidariedade fraterna, devem ter preocupações a começar do ambiente dentro da equipe de trabalho e na recepção aos iniciantes e interessados. O imprescindível é que se abram espaços para "treinamentos em serviço" e para ações de integração dos colaboradores, contando-se com uma visão de conjunto do próprio centro espírita. A colaboração é uma tônica repetida em vários momentos do romance histórico.

Entre as práticas interessantes de nosso movimento, destacamos a experiência de Mário da Costa Barbosa (1936-1990), que conhecemos pessoalmente. A vivência dele está registrada no livro Conviver para amar e servir4, editado pela FEB, durante nosso período como presidente da instituição. Nessa obra há fundamentação no atendimento à comunidade na Casa do Caminho, nos exemplos de Paulo Tarso e nos seus relacionamentos com os agrupamentos cristãos. A metodologia desenvolvida de espaço de convivência, criatividade e educação, tem sua espinha dorsal numa visão que perpassa e é aplicável a todas as atividades do centro espírita, sem ser circunscrita apenas a uma área de atuação.

Outra análise sobre labores registrados em Paulo e Estêvão tem sido feita pelo sociólogo André Ricardo de Souza, ao considerar que a experiência poderia ser considerada “uma expressão socioeconômica do cristianismo”: “formação de um empreendimento de economia solidária para que as pessoas acolhidas pela comunidade cristã, já curadas e refeitas, pudessem trabalhar de modo a buscarem, tanto quanto possível, a emancipação econômica de todo aquele grupo que abrangia cerca de cem pessoas”.5

Em nossos dias, são necessárias análises sobre os rumos do movimento espírita, sendo sugestivo o rompimento de Paulo com o farisaísmo e a opção pela simplicidade, como um repensar sobre o depoimento: "Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns. E eu faço isto por causa do evangelho, para ser também participante dele" (1 Coríntios 9,22-23).

A ideia de Paulo de se apresentar-se “como fraco” e “ser participante” desperta nossa percepção para a necessidade de se atuar em todas as faixas sociais. Com sua sólida formação cultural, ele não se posicionou como elite, despojou-se de privilégios e atendeu às necessidades da gentilidade, desde homens simples do povo, até as autoridades, mas dispensando a todos o amor fraterno.

As experiências aqui expostas sugerem alguns repensares do centro espírita, projetando-o envolvido e coerente com a comunidade onde se localiza; com atenção ao público alvo; a simplicidade do cristianismo original; a criação de espaços integrados de convivência, criatividade, educação e ativa colaboração; independência de favores governamentais, políticos e financeiros, e, desenvolvendo uma sobrevivência socioeconômica coerente com as propostas ético-morais inspiradas no cristianismo.

Em síntese, é significativa a frase de Kardec: “A bandeira que desfraldamos bem alto é a do Espiritismo cristão e humanitário, […] aí é que está a âncora de salvação, a salvaguarda da ordem pública, o sinal de uma era nova para a humanidade.”6

Referências:

1) Xavier, Francisco Cândido. Pelo Espírito Emmanuel. Paulo e Estêvão. Brasília: FEB. 2012. 488p.

2) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Epístolas de Paulo à luz do Espiritismo. Matão: O Clarim. 2016. 174p.

3) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Centro espírita. Prática espírita e cristã. São Paulo: USE. 2016. 196p.

4) Sarmento, Helder Boska de Moraes et al (Orgs.). Conviver para amar e servir. Brasília: FEB. 2013. 166p.

5) Souza, André Ricardo de. A economia solidária no livro Paulo e Estêvão. Acesso em: http://grupochicoxavier.com.br/a-economia-solidaria-no-livro-paulo-e-estevao/;

6) Kardec, Allan. Trad. Ribeiro, Guillon. O livro dos médiuns. Item 350. Brasília: FEB. 2003.

Síntese de artigo da Revista digital da FEEES A Senda – link (copie e cole): https://www.feees.org.br/…/a-senda-novembro-dezembro-2022/

No Limiar do Amanhã – Obras de Herculano Pires

No Limiar do Amanhã – Obras de Herculano Pires

       

Antonio Cesar Perri de Carvalho

A Editora Paideia, ligada à Fundação Maria Virgínia e J.Herculano Pires (São Paulo), está lançando a série de livros “No Limiar do Amanhã”, com base em transcrições das gravações de programas radiofônicos de mesmo título de Herculano Pires.

O organizador da série, Wilson Garcia, analisou e selecionou os textos e os reuniu em quatro volumes.
José Herculano Pires (1914-1979) foi um marcante vulto paulista, jornalista, destacado filósofo espírita, autor de dezenas de livros, tradutor de obras de Allan Kardec, palestrante, ativo e combatente líder espírita.
Os programas radiofônicos de Herculano Pires eram semanais, transmitidos por Rádio Mulher de São Paulo, durante quase quatro anos na primeira metade dos anos 1970. Eram retransmitidos pela Rádio Morada do Sol (Araraquara, SP) e pela Rádio Difusora Platinense (Santo Antonio da Platina, Pr). Os depositários das gravações dessas emissoras, respectivamente, Maria de Lourdes Anhaia Ferraz e Miguel Grisolia, e, Aldrovando Goes Ribeiro, doaram esses registros à Fundação, que deram origem aos livros.
Nos textos transcritos foram mantidas as falas de Herculano Pires, de maneira familiar e informal, como foram proferidas nos programas radiofônicos. Estes tinham por finalidade propiciar a sensação de proximidade entre o expositor e o radiouvinte.


Conversa sobre mediunidade. Curas, obsessões, sonhos. Livro 1.

O volume 1 da série “No Limiar do Amanhã”, intitulado Conversa sobre mediunidade. Curas, obsessões, sonhos, conta com quatro partes: Mediunidade, Curas espirituais, Obsessões, Sonhos. Nessas partes foram incluídos 237 trechos de falas de Herculano Pires atendendo a perguntas formuladas por radiouvintes e questões doutrinárias propostas pelo expositor. Portanto, era um verdadeiro diálogo entre o expositor e os radiouvintes. Pela forma simples e didática que os temas foram expostos, o livro representa uma fonte de autênticas aulas sobre Espiritismo e de fácil compreensão. Temas que eram efervescentes como Arigó e curas foram muito presentes. No geral, os assuntos tratados são de interesse na atualidade, pois partem de perguntas formuladas por curiosos e por neófitos em Espiritismo. Ou seja, as mesmas questões que geralmente surgem entre os que aportam os centros espíritas em nossos dias.


Conversa sobre a Bíblia. Os Evangelhos, a Bíblia. Livro 2.

Essa obra é muito rica de esclarecimentos lúcidos e bem doutrinários sobre os registros que integram os livros do Antigo Testamento e sobre os Evangelhos. O intelectual Herculano Pires – autor de obras marcantes sobre tal temática, como O reino; O ser e a serenidade; O espírito e o tempo -, de maneira simples e objetiva responde a perguntas, geralmente de radiouvintes evangélicos e católicos, esclarecendo muitas polêmicas e distorções relacionadas com Jesus, Maria e os discípulos. Vários episódios anotados nos textos que integram a Bíblia são comentados à luz das obras de Kardec e de textos acadêmicos, em que o expositor separa o que é mito e lenda, dos registros que podem ser fundamentados em pesquisas históricas e dos fenômenos espirituais. Os 134 trechos de respostas de Herculano Pires, selecionados pelo organizador, representam importante repositório para os estudos sobre a Bíblia e principalmente sobre os Evangelhos.


Conversa sobre Chico Xavier. Parapsicologia, reencarnação, outros temas. Livro 3.

O Volume 3 conta com quatro partes: Entrevista com Chico Xavier; Ouvintes perguntam sobre Chico; Reencarnação; Parapsicologia; Outros temas. No total, são 131 trechos principais das gravações dos programas radiofônicos. Essa obra é enriquecida com entrevista que Herculano Pires e Renato Melo gravaram com Chico Xavier, em Uberaba, quando o programa “No Limiar do Amanhã” completava um ano, em 1972. O médium respondeu sobre onze temas do momento. Entre eles esclarece sobre a reencarnação de Kardec, negando a existência de qualquer informação. Nos demais capítulos da obra, chama-nos atenção a quantidade de indagações dos radiouvintes sobre identificação de eventuais reencarnações e também de colocações de evangélicos e católicos questionando princípios espíritas e a mediunidade de Chico Xavier. Esse livro contém valiosas informações doutrinárias. Independentemente dessa obra, destacamos que Herculano Pires é autor de vários livros em parceria com Chico Xavier, editados pela Paideia e pelo GEEM. Adotando o pseudônimo de Irmão Saulo, Herculano é autor de muitos artigos de fundo doutrinário e sobre mensagens de Chico Xavier, publicados no jornal Diário de São Paulo.
 

Haverá um próximo lançamento dessa Série: Um desafio no espaço. Os Editoriais. Livro 4.
 

Preliminarmente à essa série, a Editora Paideia, utilizando as transcrições desses programas radiofónicos de Herculano Pires, já havia lançado as obras: O Evangelho de Jesus em espírito e verdade, organizado por Célia Arribas, e, No Limiar do amanhã: lições de espiritismo, organizado por Altamirando Carneiro.
O interessante é que essas obras obtidas de transcrições de gravações mostram uma outra vertente do vulto Herculano Pires. Nos livros que ele redigiu fica evidente o seu potencial intelectual e de profundo conhecedor do Espiritismo. Nos livros originados das transcrições de programas voltados ao radiouvinte, essa última característica do expositor aparece com estilo e linguajar simples. A nosso ver, essa versatilidade é que caracteriza um autêntico sábio, de também saber se dirigir aos neófitos.
Por outro lado, destacamos que o aproveitamento das gravações de programas radiofônicos evidencia a importância de se manter registros gravados e escritos de autores e lideranças espíritas. A memória do movimento espírita depende desses cuidados.

 

Informações sobre a série “No Limiar do Amanhã”:
– Editora Paideia (copie e cole): www.editorapaideia.com.br
– Fundação Maria Virgínia e J.Herculano Pires (copie e cole): www.fundacaoherculanopires.org.br

Temas oportunos em revista francesa

Temas oportunos em revista francesa

Antonio Cesar Perri de Carvalho

A Revista Espírita, fundada por Allan Kardec em janeiro de 1858, prossegue sendo publicada em edição trimestral.

Os direitos da histórica Revista foram recuperados por Roger Perez, líder francês desencarnado, que a publicou pela União Espírita Francesa e Francofônica. Na fase bem atuante do Conselho Espírita Internacional, este assumiu a publicação e, finalmente, no ano de 2010, o então secretário geral do CEI Nestor João Masotti e o dirigente Roger Perez transferiram os direitos para “Le Mouvement Spirite Francophone”. Esses registros são sempre lembrados nos Editoriais dessa Revista. Tive a honra de acompanhar momentos decisórios sobre a etapa atual da Revista, entre os anos 2.000 e 2.010, em reuniões sobre a mesma em atividades do CEI em Miami, Paris, Tours e Valencia, com a atuação de Roger Perez, Nestor Masotti e Charles Kempf.

Em edição, obviamente no idioma francês, com excelente qualidade gráfica e sempre belas diagramação e ilustrações, traz conteúdos bem fundamentados.

Nesse 165o ano de edição, a Revue Spirite do 3o trimestre de 2022, inicia com Editorial assinado por Jean-Paul Evrard, diretor da publicação, radicado na Bélgica. Além das usuais sínteses das matérias, comenta sobre o 22o Simpósio da Francofonia, programado pra Wégimont (Bélgica) de 09 a 11 de setembro de 2022, sobre o tema “Os valores espíritas, um caminho para a Paz!”. Como sempre, homenageia Roger e Masotti pela cessão legal dos direitos da Revista para “Le Mouvement Spirite Francophone”.

Há tempos o periódico comenta cartas familiares psicografadas por Chico Xavier, de livro que efetiva estudos de casos elaborados por Paulo Rossi Severino (A vida triunfa, ed. AME São Paulo). Na edição recente focaliza histórica mensagem assinada pelo jovem William Machado Figueiredo, psicografada por Chico Xavier em Pedro Leopoldo no dia 24/11/1941.

O autor Julien Philippe assina algumas matérias substanciosas e que, geralmente, não são usuais nas revistas espíritas. Esse autor focaliza o tema “Metapsíquica”, empregando comentários e raciocínios de Allan Kardec expressos no livro A Gênese. Philippe conclui que o “a teoria que vê nos fundamentos da matéria um caráter mental irredutível ao psíquico é o panpsiquismo, que está atualmente passando por um grande renascimento porque a consciência não pode ser reduzida ao físico e biológico pelas atuais teorias da mente”.

Outra matéria marcante, assinada por Charles Kempf e Julien Philippe, é “Espiritismo e laicismo”, destaque na capa da “Revista”. Num longo e fundamentado texto, os autores analisamo conceito de religiãoem obras de Kardec, compatíveis com o laicismo; o contexto do Brasil onde o Espiritismo é reconhecido como religião; a trajetória do conceito de religião na França, desde a Revolução Francesa até as leis republicanas; cita recomendações da ONU emanadas do documento “Tratado para a paz global”, resultante da Cúpula Mundial do Milénio para a Paz (Nova York, agosto de 2.000). Os autores entendem que há trechos de Kardec e de Léon Denis, “incompatíveis com o princípio da laicidade, não abrangendo os seguidores de religiões não cristãs”. Mostram-se preocupados com a receptividade da proposta espírita junto a outros povos, “fazem reaparecer a heteronomia”. No final, Charles e Philippe anotam que “é verdade que o Espiritismo é essencialmente moral: ‘Fora da caridade não há salvação’, e que a moralidade também é essencial em uma sociedade laica”. Destacam que “o Espiritismo apresenta as leis morais universais, baseadas nas Leis Naturais ou Divinas. Jesus (desmitificado) e os Evangelhos (na sua essência) são citadas como exemplo de moral (característica da cultura ocidental), mas sem exclusividade ou superioridade. O Espiritismo é compatível com uma sociedade laica cujos fundamentos compartilha”. Sem dúvida, artigo instigante para análises.

Há várias outras matérias interessantes, com temas da atualidade, como “Fatores espirituais da obesidade”, e algumas delas traduzidas de artigos assinados por brasileiros. Entre esses “Os valorosos mártires esquecidos de Lyon”, de Enrique Eliseo Baldovino que cita a obra Ave, Cristo!, de Emmanuel (FCX) e várias outras, originalmente publicado no jornal “Mundo Espírita”, do Paraná. No último artigo, há comentários sobre mensagem “A semente” do livro Pão Nosso (Emmanuel, FCX).

A Revista Espírita vem mantendo a oportuna divulgação das obras de Allan Kardec e de Léon Denis, editadas na França e na Bélgica, e, sempre destaca obras de Chico Xavier, várias delas traduzidas para o francês.

Fonte:

Revue spirite. Ano 165. 3º trimestre de 2022. 

Informações: www.revue-spirite.org; www.lmsf.org

A religião na berlinda

A religião na berlinda

Vladimir Alexei

O ser humano, por instinto, de forma natural, sabe que a vida é finita e que a morte é a única certeza que temos na existência. Um dia fecharemos os olhos para não mais abrir nessa vida.

A doutrina espírita nos ajuda a compreender melhor o que ocorre com o ser humano após a sua morte. Porém, nem toda religião é transparente em relação à continuidade da vida. Este, talvez, seja um dos dogmas que se possa considerar importante, afinal, as religiões para não esclarecer seus adeptos da melhor maneira, lançam ideias que são aceitas sem questionar, ainda que haja inquietação interior por parte de alguns adeptos.

A falta de esclarecimento por parte das religiões é intencional.

A religião tradicional, materialista, entende que seu profitente busca a “salvação” e, conforme sua crença, a salvação se dá por meio de uma série de atividades, práticas e rituais que, seguidos rigorosamente, transportam o “morto” para o céu. Aqueles que não conseguem seguir os rituais impostos pelas religiões, eximidas de quaisquer responsabilidades caso seu adepto não alcance o céu, vão amargar em um entreposto denominado purgatório até chegar ao destino final, eterno, que é o inferno. Nessas linhas simplistas é possível perceber que trata-se de um processo de salvação. É para isso que as religiões tradicionais ainda constroem templos suntuosos, faraônicos, que visam demonstrar sua importância, poder diante de uma sociedade enferma que, logo baterá a porta em busca de salvação.

No ano de 2022, no período que antecedeu as eleições em primeiro e segundo turnos, bem como durante as eleições e após, observou-se um movimento constrangedor tomando forma na sociedade enferma. Brigas, disputas, pregações inflamadas, profetizações para um candidato, para outro, o ápice do movimento obsessivo chegou, quando um destes ditos representantes de Deus na Terra, profetizaram a morte de um candidato.

Já estava ruim, mas a partir do momento que alguém profetiza a morte de outro, talvez seja o momento para uma reflexão menos apaixonada, desgovernada e mais racional, lembrando que são pastores que possuem rebanhos.

Freud, apesar de materialista e ter optado por ignorar o mundo espiritual, mesmo com todas as evidências que o cercaram durante suas pesquisas, descreveu o presente momento em que as pessoas se descontrolam de forma coletiva da seguinte forma: “a massa é impulsiva, volúvel e excitável. É guiada quase exclusivamente pelo inconsciente (podemos entender, do ponto de vista espírita, pelo inconsciente e os espíritos). (…) A massa é extraordinariamente influenciável e crédula, é acrítica, o improvável não existe para ela. Pensa em imagens que evocam umas às outras associativamente, como no indivíduo em estado de livre devaneio, e que não tem sua coincidência com a realidade medida por uma instância razoável”.

Independente da classificação – que é uma maneira de organizar as informações para melhor utilizá-las –, “massa de manobra”, “obsessão coletiva”, etc., para quem não está envolvido nesse cipoal, é possível perceber com bastante clareza que o propósito da religião se perdeu nas dificuldades humanas.

Poderíamos discutir as dificuldades humanas em diversas frentes, como dificuldades morais, intelectuais e espirituais. Esta, é a que mais nos chama a atenção, pela fragilidade.

Nas anotações do evangelista Mateus, cap. 6, versículos 19-21, Jesus disse para que “não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões não minam, nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.”

Será que os ensinamentos de Jesus perderam o sentido espiritual para as religiões tradicionais? Será que Jesus é apenas instrumento de poder transitório para as religiões cada vez mais materialistas? Será que Jesus morreu para as religiões?

O Evangelho não mudou. Os ensinamentos de Jesus continuam os mesmos. Entretanto, percebe-se com muita nitidez, que os ensinamentos do Cristo estão sendo cada vez mais submetidos aos mandos e desmandos dos desejos materialistas, transitórios, em que a traça e a ferrugem tudo consomem!

A violência se alastrou na velocidade da tecnologia. As redes sociais diminuíram a distância entre a decência e a descrença absoluta, a ponto de as religiões tradicionais não conseguirem mais influenciar seus adeptos e nem muito menos os jovens.

Há rumores de que, pela primeira vez, o número de ateus nos próximos anos será maior no Brasil do que os religiosos tradicionais. E, em se confirmando, uma interpretação possível é o completo e absoluto falimento do sistema religioso tradicional.

A religião precisa resgatar a religiosidade nas pessoas, a espiritualização. As pessoas encontram-se divididas e a religião tradicional insufla esse processo de divisão, com uma pseudo postura de respeito às diferenças. Isso não procede.

O papel da religião é apresentar o seu pensamento mais elevado para que seu adepto tenha uma diretriz para seguir diante das tempestades que surgem em seu caminho. Pastores e Padres se perderam no materialismo gritante e avassalador. Se deixaram influenciar pelas mazelas da sociedade desigual, racista, misógina e ortodoxa, quando se esperava deles a demonstração de caminhos que eles representam – não se espera dessas autoridades religiosas a infalibilidade que lhe são atribuídas e sim, que a direção seja apontada, mesmo que eles não estejam em sintonia com a direção!

O filósofo Luc Ferry nos lembra que a salvação é o grande mote das religiões. Se compulsarmos a história, desde que o homem se desviou do caminho que as religiões pregam, a salvação passou a ser uma questão de honra e por isso, seus representantes “vendem a alma” para encontrar um lugarzinho para seus adeptos no céu.

O momento requer prudência e sabedoria, mas também ousadia em romper com esse ciclo vicioso e retornar à pureza do Cristianismo Primitivo, quando se interpretavam os ensinamentos de Jesus independentemente de seus interesses pessoais! É o momento de aplicar os ensinamentos de Jesus, quando diz que não veio trazer a paz e sim a espada, para que esses fios que nos prendem ao passado de culpa, mandos e desmandos religiosos, sejam desfeitos e tenhamos oportunidade de começar uma nova vida, ainda em vida!

Falamos das religiões tradicionais, mas e no Espiritismo, estaríamos agindo da mesma forma?

Busquemos na simplicidade dos ensinamentos do Cristo o resgate aos Seus valores mais profundos e transformadores. Não sejamos motivo de escândalo. Que o desejo de amar seja mais forte do que o de expressar seu descontentamento inócuo, fazendo coro a uma massa disforme, limitada e temerária. Sejamos luz!

(*) Belo Horizonte, 07/11/2022.

A simplicidade da comunidade orientada por Saulo de Tarso

A simplicidade da comunidade orientada por Saulo de Tarso

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Em julho, completou-se 80 anos do lançamento do romance Paulo e Estêvão, a magistral obra psicografada por Francisco Cândido Xavier, de autoria do espírito Emmanuel.

Emmanuel detalha alguns textos do Novo Testamento – Atos e as Epístolas de Paulo -, focalizando a saga do doutor Saulo de Tarso, autoridade na Lei Mosaica, e seu processo de transformação no Apóstolo do Cristo, tendo que suplantar inúmeros constrangimentos e dificuldades.

Depois de alguns dissabores ao visitar a Casa do Caminho, discordando das propostas judaizantes de Tiago e de Pedro, o ex-doutor da Lei dirigiu-se para Antioquia. Nessa cidade se encontrou com Barnabé, ex-levita de Chipre, que assumia grandes responsabilidades junto a um grupo de seguidores de Jesus e que reclamava a cooperação.

Anota Emmanuel: “Pressuroso e prestativo, Saulo de Tarso em breve se instalava em Antioquia, onde passou a cooperar ativa mente com os amigos do Evangelho. Durante largas horas do dia, consertava tapetes ou se entretinha no trabalho de tecelagem. Destarte, ganhava o necessário para viver, tornando -se um modelo no seio da nova igreja.”

Nesse ambiente Saulo tornou-se “um amigo amado de todos. Saulo sentia-se imensamente feliz. “

Interessante é o registro do autor espiritual sobre o ambiente da novel comunidade. “A instituição de Antioquia era, então, muito mais sedutora que a própria igreja de Jerusalém. Vivia-se ali num ambiente de simplicidade pura, sem qualquer preocupação com as disposições rigoristas do judaísmo.”

E complementa Emmanuel: “Os israelitas, distantes do foco das exigências farisaicas, cooperavam com os gentios, sentindo-se todos unidos por soberanos laços fraternais.”

Mais à frente, Emmanuel destaca: “As assembleias eram dominadas por ascendentes profundos de amor espiritual. A solidariedade estabelecera-se com fundamentos divinos. As dores e os júbilos de um pertenciam a todos. A união de pensamentos em torno de um só objetivo dava ensejo a formosas manifestações de espiritualidade.”

E surge uma observação marcante: “Em noites determinadas, havia fenômenos de “vozes diretas”. A instituição de Antioquia foi um dos raros centros apostólicos onde semelhantes manifestações chegaram a atingir culminância indefinível. A fraternidade reinante justificava essa concessão do Céu. Nos dias de repouso, a pequena comunidade organizava estudos evangélicos no campo. A interpretação dos ensinos de Jesus era levada a efeito em algum recanto ameno e solitário da Natureza”.

O ambiente despojado e simples, a solidariedade e a fraternidade como base favorecia “formosas manifestações de espiritualidade”.

A essa altura, refletimos que a prática do intercâmbio com a espiritualidade superior torna-se facilitada pelo ambiente de benevolência, concórdia e união. Ou seja, a mediunidade não se faz apenas com estudo e normas teóricas, mas a adequada relação com espíritos esclarecidos é favorecida pelo cultivo do sentimento no diapasão do bem.

No texto de Paulo e Estêvão, detalhando os albores da movimentação dos seguidores de Jesus e a experiência de vida de Paulo de Tarso, encontramos muitos subsídios para analisarmos, na atualidade, o funcionamento dos centros espíritas e, inclusive, a prática da mediunidade.

Referência:

Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Paulo e Estêvão. 2ª parte. Cap. IV. FEB.

Imortalidade significa “amor sem adeus”

Imortalidade significa “amor sem adeus”

Antonio Cesar Perri de Carvalho

O título de livro – Amor sem adeus -, é muito sugestivo. Obra psicográfica de Chico Xavier reúne cartas escritas por um jovem desencarnado que, ao vencer a barreira da morte, voltou a conversar com entes queridos que ficaram na Terra.

Entre as dezenas de livros psicografados por Chico Xavier contendo as chamadas “cartas familiares”, essa obra reúne mensagens de Walter Peronne, com organização de Hércio Arantes, lançado pela editora IDE, de Araras, em 1979.

A tônica das mensagens espirituais e que identificam o espírito comunicante assinalam claramente que no contexto da imortalidade da alma caracteriza um típico amor sem adeus.

A certeza da imortalidade da alma propiciada pelo Espiritismo é fundamentada nas informações trazidas pelo intercâmbio mediúnico e que demonstram não apenas a sobrevivência espiritual após a morte do corpo, mas a preservação de sua individualidade e condições de identificação.

Desde o pioneiro estudo de casos efetuado por Allan Kardec na obra O céu e o inferno, esses aspectos são assegurados e sinalizam as diversas condições dos desencarnados, com diferentes estados de alma. O Espiritismo assegura que os espíritos não estão condenados, mas estão submetidos à misericórdia de Deus, o Pai bom e justo.

Portanto as diversas gradações de conhecimento e de compreensão de seus estados de alma são suscetíveis a mecanismos de progresso espiritual.

Esses fatos claramente alteram o cenário alimentado por diversas tradições religiosas de cultuar os chamados mortos, no dia de Finados, com choros e lamentações muitas vezes em desequilíbrio.

A melhor maneira de cultuar e homenagear os espíritos é com a oferta de preces, de pensamentos bons e harmonizados. E, sem dúvida, oferecendo o esforço vivo de melhoria de pensamentos, de intenções e de ações.

É a maneira mais gratificante para se lembrar de espíritos que mantém alguma relação conosco, inclusive no contexto familiar. Isso porque os elos familiares e de amizades não são interrompidos, apenas há uma transformação para as interrelações entre as dimensões corpóreas e as espirituais.

Os laços de amor não desaparecem, por isso que não há o adeus. Pelas alterações de dimensão – entre a corpórea e a incorpórea -, seria um até breve.

Em Finados como em qualquer dia do ano, não nos fixemos na ideia do adeus, do choro e das lamentações.

Procuremos nos esforçar para ofertar pensamentos e sentimentos de gratidão, de homenagem sincera, de doação vibratória e de paz.

Esse conjunto supera o adeus e amplifica a ideia do amor real.

“Fake news” nos contatos espíritas

“Fake news” nos contatos espíritas

 

Antonio Cesar Perri de Carvalho

No mundo de provas e expiações em que vivemos predominam os contrastes e, naturalmente, há uma grande diversidade nos níveis de compreensão, de vivência e de conhecimento nas diversas áreas.

Ao longo de várias décadas de vida, nunca convivemos com um ambiente de aguçado radicalismo, com nuances de ódio, e divulgação de mensagens adulteradas, como o cenário atual de nosso país.

Sem dúvida, essa situação foi favorecida pela amplidão dos meios de comunicação, principalmente pelas redes sociais propiciadas pela internet.

Evidentemente que a censura e o controle de opiniões não é cabível no ambiente democrático.

Sem entrarmos na questão da proliferação de “fake news” patrocinadas por envolvidos na política partidária e com interesses eleitorais, preocupa-nos a maneira como espíritas estão empregando as redes sociais.

Parece que vários estariam entrando nessa “onda”. Em muitos casos, na realidade, com base na expectativa de um comportamento coerente com os princípios espíritas não se diferenciariam da massa predominante.

Até Chico Xavier foi utilizado em manipulações que nitidamente não condizem com o perfil do notável vulto espírita.

Frente a esse cenário confuso, torna-se cabível um reestudo do conteúdo da 3a parte de "O Livro dos Espíritos", focalizando as "Leis morais". E, sem dúvida, o desdobramento temático que Allan Kardec efetivou em "O Evangelho segundo o Espiritismo". Essas duas obras básicas do Espiritismo explicitam princípios que devem servir de roteiro para todos nós, os espíritas. Inclusive com a anotação de Kardec, nessa última obra, de que "reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más” (Cap. XVII, item 4).

Isso posto, cabe a reflexão para subsidiar o livre arbítrio de cada um: como reagir frente a riscos, intrigas, maledicências e várias formas de manipulação social? É hora de se aumentar os cuidados de prévia análise e de muita prudência antes de se “compartilhar” mensagens das redes sociais. Seria lícito em respeito aos direitos autoral e moral de obras e textos, extrairmos trechos e os empregarmos descontextualizados da forma e momentos em que foram elaborados? Se devemos exercitar o respeito ao próximo, surgem algumas reflexões: como compreender as opiniões e posições das pessoas? Como se evitar tendências ultrapassadas de doutrinação e de controle? Como analisar textos e notícias à luz dos princípios espíritas? Como não ferirmos a individualidade das pessoas e não realizarmos a invasão da privacidade? Como evitarmos a disseminação de comentários sensacionalistas? Como contribuir com esclarecimentos coerentes com a análise cristã e espírita? Como manter uma postura prudente e de bom senso? Enfim, como contribuir com o bem estar psicológico e espiritual do próximo e da sociedade?

A nosso ver essas reflexões são cabíveis no cenário conturbado que estamos vivendo, para se favorecer o emprego lúcido e prudente do livre arbítrio.

O roteiro a ser seguido demanda tempo para o processo educativo.

Para essa nossa longa caminhada, Allan Kardec é claro em “O Evangelho segundo o Espiritismo”: “Amar o próximo como a si mesmo: fazer pelos outros o que quereríamos que os outros fizessem por nós” é a expressão mais completa da caridade, porque resume todos os deveres do homem para com o próximo. Não podemos encontrar guia mais seguro, a tal respeito, que tomar para padrão, do que devemos fazer aos outros, aquilo que para nós desejamos. Com que direito exigiríamos dos nossos semelhantes melhor proceder, mais indulgência, mais benevolência e devotamento para conosco, do que os temos para com eles? A prática dessas máximas tende à destruição do egoísmo. Quando as adotarem para regra de conduta e para base de suas instituições, os homens compreenderão a verdadeira fraternidade e farão que entre eles reinem a paz e a justiça. Não mais haverá ódios, nem dissensões, mas tão somente união, concórdia e benevolência mútua.” (Cap. XI, item 4).