Informação histórica do 1º Congresso de Unificação

Informação histórica do 1º Congresso de Unificação

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Como uma breve anotação sobre o evento marcante que ocorreu em São Paulo há 70 anos atrás, sintetizamos informações extraídas de obras que fazem registros do movimento espírita.

O ano de 1948 registrou três importantes eventos: dois ligados aos jovens espíritas e o outro sobre unificação.

Surgiu a Concentração de Mocidades Espíritas do Brasil Central e Estado de São Paulo – COMBESP, reunindo jovens de Mato Grosso, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e depois o Distrito Federal (Brasília). Este certame, autônomo, foi um celeiro de formação de expositores e lideranças. O evento foi repetido em rodízio por várias cidades dos Estados citados entre 1948 e 1966, e nestes anos foi efetivado na cidade de Barretos (SP).1

Liderado pelo incansável Leopoldo Machado, de Nova Iguaçú (RJ), foi realizado o 1o Congresso de Mocidades Espíritas do Brasil (17 a 25/7/1948) na cidade do Rio de Janeiro, e que constituiu o Conselho Consultivo de Mocidades Espíritas do Brasil. Foi efetivado no Teatro João Caetano e o encerramento na sede da FEB, embora o presidente da FEB não apoiado o Congresso, cedeu o auditório da Instituição para a atividade de encerramento do evento, sendo Lins de Vasconcelos incumbido de representar a FEB.1

A essa altura já se preparava a realização do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita, inicialmente planejado por idealistas de São Paulo.2

Embora a FEB não tenha aceitado o convite para ter atuação no evento, este contou com adesão de vários Estados.

O Congresso Brasileiro de Unificação Espírita foi realizado pela USE no período de 31 de outubro a 5 de novembro de 1948, em São Paulo, com registros detalhados nos Anais do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita.2

Houve o apoio e atuação nos preparativos de dirigentes da USE-SP, Federação Espírita do Estado do Rio Grande do Sul, Federação Espírita do Paraná, Federação Espírita Catarinense, União Espírita Mineira, Liga Espírita do Brasil, Conselho Consultivo das Mocidades Espíritas do Brasil e lideranças espíritas.2,3

Em função desse evento surgiu a primeira psicografia de Chico Xavier sobre união e unificação, que foi assinada por Emmanuel – “Em nome do Evangelho” -, e dirigida aos participantes do citado 1o Congresso Brasileiro de Unificação Espírita, em São Paulo. Essa mensagem, com o título acima, foi psicografada no dia 14 de setembro de 1948, em Pedro Leopoldo, Minas Gerais, e encaminhada aos organizadores do evento com a justificativa de que ele – Chico Xavier -, como convidado, não poderia comparecer. Foi publicada na íntegra nos Anais.2,3,4

Ao Congresso, compareceram dirigentes da USE-SP e de outras instituições paulistas, Federação Espírita do Estado do Rio Grande do Sul, Federação Espírita do Paraná, Federação Espírita Catarinense, União Espírita Mineira, Liga Espírita do Brasil, Conselho Consultivo das Mocidades Espíritas do Brasil, Lar de Jesus de Nova Iguaçú (RJ), Centro Espírita de Cuiabá, e pessoas que tinham procurações de instituições de Sergipe, Bahia, Pará, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte.2

Ao final foi aprovado um Manifesto do Congresso.

Textos constantes nos Anais do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita e registros sobre a atuação de Leopoldo Machado e várias lideranças da época no citado Congresso Brasileiro e no Estado de São Paulo, foram enfeixados em livro de autoria de Eduardo Carvalho Monteiro.3

Eis o depoimento de Carlos Jordão da Silva, participante desse Congresso Brasileiro e também ex-presidente da USE-SP:

“Tivemos aqui em São Paulo, em 1948, o Primeiro Congresso Brasileiro do Unificação, com a presença de delegações do todos os Estados Sulinos e alguns do Norte, não tendo a Federação Espírita Brasileira na ocasião aceito participar. Estabeleceu-se que a Federação Espírita do Rio Grande do Sul, através de sua delegação mantivesse os entendimentos com a FEB para que se efetivasse a Unificação das Sociedades Espíritas e Espíritas no campo nacional. […] Após as reuniões do Congresso Panamericano e recolhidos lodos os participantes das delegações em seus respectivos hotéis, cerca de uma hora da manhã, resolvemos sair para tomar um pouco de ar e dirigimo-nos para determinada praça próxima ao nosso hotel e para a nossa surpresa todas as delegações foram chegando ao mesmo local, como que convocadas por forças invisíveis. Achamos graça por ter o Plano Espiritual nos reunido daquela forma e aquela hora da madrugada e ali mesmo marcamos uma reunido para as 8 horas da manhã, no Hotel Serrador, onde estávamos hospedados, eu e minha Senhora, e, realizada tal reunido, incumbiu-se Artur Lins de Vasconcellos Lopes a tarefa de aproximar-se da FEB para promover o encontro.”3,4

Em função desse momento relatado por Carlos Jordão da Silva, repentinamente, e num único dia foi assinado o “Pacto Áureo”, aceito pelos presentes à reunião no Rio de Janeiro, mas que não atendia aos anseios do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita e de muitas lideranças espíritas do Brasil.3,4

Referências:

1) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Centro espírita. Prática espírita e cristã. São Paulo: USE. 2016. 196p.

2) Anais do Congresso Brasileiro de Unificação Espírita. São Paulo: USE. 1947. 191p. Edição em versão digital: http://www.autoresespiritasclassicos.com/Autores%20Espiritas%20Classicos%20%20Diversos/USE/ANAIS%20do%20Congresso%20Brasileiro%20de%20Unifica%C3%A7%C3%A3o%20Esp%C3%ADrita%201948.htm

3) Monteiro, Eduardo Carvalho; D’Olivo, Natalino. USE – 50 anos de unificação. São Paulo: USE. 1997. 335p.

4) Carvalho, Antonio Cesar Perri. União dos espíritas. Para onde vamos? 1.ed. Capivari: Ed. EME. 2018. 144p.

(*) – Foi presidente da USE-SP e da FEB.

A pequena Louise, filha adotiva de Hyppolite Léon Denizard Rivail e de Amélie Boudet

A pequena Louise, filha adotiva de Hyppolite Léon Denizard Rivail e de Amélie Boudet

Charles Kempf (*)

Houve muitas especulações sobre a questão: porque Hyppolite Léon Denizard Rivail e Amélie Boudet não tiveram filhos? Até mesmo a afirmação de que teriam concluído um pacto de abstinência… Os documentos originais encontrados recentemente lançaram luz sobre essa questão.

Em primeiro lugar, o casamento deles data de quinta-feira, 9 de fevereiro de 1832. Naquele dia, Hyppolite tinha 27 anos e Amélie 36 anos, o que era muito para a época. Também, na época de seu casamento, Hyppolite era "soldado do 61º Regimento de Infantaria de Linha, guarnecido em Rouen, Departamento do Sena Inferior". Seu contrato de casamento não menciona nenhum pacto de abstinência.

Em uma carta de Hyppolite dirigida a Amélie, datada de 20 de agosto de 1834, depois de uma viagem de carruagem de Paris a Lyon,onde Hyppolite ia visitar sua tia paterna Reine Matthevot (nascida Rivail), ele fala “das comodidades da viagem": "Na maior parte do caminho, tive o prazer de ter a companhia de uma criança de um ano no carro que, por seus gritos e cheiros, nos ofereceu uma pequena repetição da tarefa e me fez desfrutar antecipadamente dos encantos da paternidade;"

Não há dúvida de que Hyppolite e Amélie consideraram a paternidade, mas a natureza provavelmente não lhes permitiu ter um filho natural.

Mas em outra carta de Hyppolite a Amélie, datada de 23 de agosto de 1841, quando Hyppolite estava novamente em Lyon para o funeral de sua tia Reine Matthevot, ele escreveu: "Abrace bem a minha pequena Louise, cuja escrita me fez muito prazer." Em uma carta de 9 de outubro de 1841, de Paris a Château du Loir (lar dos pais de Amélie, onde Hyppolite e Amélie costumavam ficar de veraneio), Hyppolite escreve: "Beije minha pequena Louise por mim."

Em outra de 12 de outubro de 1841, Hyppolite escreveu mais especificamente: "Eu queria consultar Mariette esta manhã para saber o que se deveria fazer por Louise em caso de dificuldade, mas ela não retornou há dois dias; eu sei onde ela está, mas é um pouco longe; e seria difícil não dizer impossível vê-la a tempo. Se, no entanto, alguma coisa acontecesse, escreva-me logo enviando-me cabelos e eu a consultarei. No intervalo, penso que se deve cuidar para que ela não tome chuva; como você sabe, seria prejudicial para ela."Esta carta é notável, porque mostra que Hyppolite e Amélie consultavam em Paris uma "sonâmbula" chamada Mariette, especialmente em caso de problemas de saúde, e que utilizavam até cabelos, enviados por carta, para ajudar a sonâmbula na psicometria.

Entendemos melhor porque Allan Kardec escreveu mais tarde que o Magnetismo abriu o caminho para o Espiritismo. Além disso, esta carta indica uma saúde frágil da pequena Louise. Finalmente, numa carta de 15 de agosto de 1842, de Aachen a Château du Loir, Hyppolite é muito mais específico: "Aprendi com prazer que Louise trabalha bem à medida que avança na leitura e na escrita. Fiquei muito feliz com a sua pequena carta. Espero que ela possa ler a minha sozinha. Quanto ao cálculo, não deve ser negligenciado; mas na ausência do aritmômetro, é necessário usar fichas; você deve ter certamente nas caixas de jogos.Um exercício excelente e que ela deve começar a ser capaz, é de atribuir às fichas aos cartões de uma determinada cor um valor de 10 ou de 100. Assim, para fazer 345, precisa colocar 3 fichas de 100, 4 de 10 e 5 de 1. Ou seja, como segue + + + 0 0 0 0 1 1 1 1 1. Deve exercê-la ou a ler os números assim compostos, ou a compor outros ela mesma. Mas é claro que precisa começar com números pequenos e aumentar apenas gradualmente. Quando ela estiver bem familiarizada com este exercício, será preciso utilizar os algarismos, e fazê-la entender que os algarismos da primeira coluna a direita valem tantas unidades, os da segunda valem tantas dezenas ou fichas de 10 etc. Será necessário exercê-la, vendo um número escrito em algarismos, a compô-lo com fichas, e vice-versa." Nós vemos claramente o "professor" aplicando os métodos de ensino de Pestalozzi que ele melhorou e completou!

Em 22 de outubro de 1843, Hyppolite menciona numa carta à Amélie, de Paris para Château du Loir: “Anexo está uma cartinha para Louise”. Infelizmente não temos o original desta cartinha que foi entregue por Amélie a Louise. Em 6 de novembro de 1843, Hyppolite escreveu para Amélie, de Paris para Château du Loir: "Beije minha querida Louise por mim e diga a ela que fiquei muito feliz com sua carta; mostrei-a a várias pessoas que ficaram muito satisfeitas."

Há outros elementos em uma carta de 16 de setembro de 1844, de Paris para Château du Loir, onde Hyppolite que fala da cama de Louise em sua residência em Paris, onde ele escreve: “Quanto a Louise, acho que ela aproveita bastante. Peço-lhe que cumprimente suas galinhas, as quais abraço de todo coração, e ela também.” Pode-se imaginar a menina vivaz no campo em Château du Loir, cuidando do galinheiro dos pais de Amélie.

Em 27 de setembro de 1844, Hyppolite escreve: "Adeus, minha querida, abraça por mim minha boa pequena Louise, que, penso, se diverte de todo o coração." Essas cartas não deixam nenhuma dúvida sobre o fato que Hyppolite Léon DenizardRivail e Amélie Boudet criaram e educaram uma menina chamada Louise, provavelmente adotiva, e a quem tinham dado o segundo nome de Jeanne Louise Rivail (nascida Duhamel), mãe de Hyppolite. Mas essa alegria seria de curta duração.

Em 29 de setembro de 1845, de Paris para Château du Loir, Hyppolite escreveu para Amélie: "Como você me dizia que se você não escrevesse para mim, seria porque Louise iria continuar melhorando, então espero que a melhora se confirmou: concebo tudo o que isso deve lhe causar tormento e fadiga, porquanto você precisava muito de repouso.”

Os problemas de saúde da pequena Louise pareciam estar piorando. Amélie retornou depois a Paris com a pequena Louise, e é numa carta do pai de Amélie (que desencarnou em 6 de julho de 1847 aos 79 anos) para Amélie, datada de 6 de dezembro de 1845, que apreendemos a morte da pequena Louise: "Eu não demorei para lamentar, minha querida Amélie, o evento infeliz que você anuncia na sua última carta; com o que você tinha escrito para nós e o que Mad. Gendron havia nos dito, eu esperava todos os dias receber essa má notícia: é muito triste e muito lamentável deixar a vida quando estamos apenas começando a aproveitá-la, enquanto outros que tiveram uma longa carreira poderiam terminá-la sem se arrepender tanto: como você me diz, não é da natureza do homem ser perfeitamente feliz, devemos nos contentar com a porção que nos é distribuída. Percebo o quanto isso deve ter afetado o Sr. Rivail, desejo que ele se recupere."

Consultamos os arquivos on-line do estado civil reconstituído de Paris, mas com a classificação pelo nome, não encontrei nenhuma Louise Rivail, nem Duhamel, nem Boudet, que morreu naquele período. Uma busca por data é necessária, e talvez possível nos microfilmes. Isso permitiria esclarecer qual era o nome dessa menininha, provavelmente adotiva.

Este episódio lança luz sobre o caminho difícil de Hyppolite Léon Denizard Rivail e Amélie Boudet no período antes da observação do fenômeno de mesas girantes, em maio 1855, que o fez declarar em Obras Póstumas: "Foi aí que, pela primeira vez, presenciei o fenômeno das mesas que giravam, saltavam e corriam em condições tais que não deixavam lugar para qualquer dúvida. Assisti então a alguns ensaios, muito imperfeitos, de escrita mediúnica numa ardósia, com o auxílio de uma cesta. Minhas ideias estavam longe de precisar-se, mas havia ali um fato que necessariamente decorria de uma causa. Eu entrevia,naquelas aparentes futilidades, no passatempo que faziam daqueles fenômenos, qualquer coisa de sério, como que a revelação de uma nova lei, que tomei a mim estudar a fundo."

Os espíritas sabem o que se seguiu: o trabalho magistral da Codificação Espírita, de Allan Kardec, que hoje desfruta, depois de mais de um século e meio, dezenas de milhões de admiradores em todo o mundo, e que, ao mesmo tempo, abriu todo um campo de pesquisa científica sobre o mundo espiritual e consolou tantos corações feridos.

Muito obrigado Allan Kardec, muito obrigado Amélie Boudet!

(*) De Belfort, França. Membro da Comissão Editorial da Revue Spirite. Foi secretário geral do Conselho Espírita Internacional.

Transcrito de:

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O menino livre de Miritiba. Humberto de Campos

O menino livre de Miritiba. Humberto de Campos

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Excelente oportunidade para se conhecer o escritor Humberto de Campos, com base em seus livros como encarnado e como espírito pela psicografia de Chico Xavier, e ainda com lances sobre sua vida desde a infância.

No livro O menino livre de Miritiba. Humberto de Campos, publicado pelo IDE (de Araras, SP) o autor Cláudio Bueno da Silva focaliza momentos da vida de Humberto de Campos considerado um dos grandes escritores brasileiros.

Nascido em Miritiba (Maranhão), órfão de pai, passou momentos difíceis naquela cidade, em Parnaíba (Piauí) e depois na adolescência em São Luís. Sempre contou com o apoio de sua genitora Dona Anita. Dessa época surge a ideia do título da obra de Cláudio. Estabelecendo-se na então capital Rio de Janeiro, encaminhou-se para a área do jornalismo, notabilizando-se como um dos escritores mais lidos em sua época.

O autor procurou “identificar os antecedentes da transformação ocorrida com Humberto de Campos, que o fizeram sair da zona inquietante da dúvida, quando encarnado, para o terreno da certeza, que pisou assim que perdeu, para a morte, o corpo cansado e doente.” O livro se divide em três partes: O menino livre de Miritiba, novela criada com base no livro Memórias, de Humberto de Campos; Impressões de leitura, viagem espírita sobre 25 livros de Humberto de Campos acadêmico; e, A trajetória da dúvida à certeza, que são reflexões sobre vida, a morte e o pensamento de Humberto de Campos.

Vem à tona o estilo e as motivações do escritor com temas de fundo moral e espiritual. O interessante é que Humberto de Campos atendia inúmeras pessoas que o consultavam por cartas e em visitas. Muitas das questões colocadas por estas pessoas ela as respondia em artigos publicados na imprensa carioca. Assim, o jornalista, escritor, deputado federal e membro da Academia Brasileira de Letras era um personagem muito conhecido no país e principalmente na capital federal.

Em um momento sua atividade jornalística redigindo histórias humorísticas adotando o pseudônimo de Conselheiro XX, tornou-se muito popular.

Humberto de Campos era amigo pessoal – e de fazer visitas constantes -, do romancista Coelho Neto, também membro da Academia Brasileira de Letras. Soube que seu amigo quando se encontrava abatido era tratado, enquanto dormia, pela esposa e por uma doméstica que o “defumava com ervas prestigiosas”. Coelho Neto veio a se convencer do Espiritismo após um fato inusitado em que teve a certeza da sobrevivência espiritual de sua filha.

O escritor também registra que em visita que fez ao seu Estado natal, como deputado, nos idos de 1928, que o diretor da Estrada de Ferro comentou com ele “achar-se grandemente disseminada em Coroatá a paixão do Espiritismo”.

Em realidade o escritor sempre focalizou a questão da morte: “Eu sou, ordinariamente, um homem que tem medo da morte” e o dilema “a certeza de que os outros aqui ficam e o morto não sabe para onde vai”. Num crônica sobre Finados, anotou: “Parece que a Morte, neste momento, se acha confundida com a Vida”. De outra feita, registrou o medo de “ter a sua memória enterrada com seu corpo”, e, ainda “espiando a morte, conhecer o engano da vida”.

Com frequência, o escritor fazia referência a textos bíblicos e casos relacionados com a Judeia. Em outros momentos: “Homens ricos e poderosos que vos banqueteais sobre miséria de Lázaro, escutai, se tendes ouvidos, a palavra dos profetas”. Escreve crônicas em forma de parábolas, sempre com fundo moral e instrutivo. Enaltece a caridade.

Mas insistia na dúvida: “Em matéria de religião, de ciência e de filosofia, eu nada afirmo e nada nego. Nem, mesmo, duvido. Sou um náufrago solitário e tranquilo, num rochedo do oceano. Espero”.

Já escrevia sobre a “a capacidade de renúncia do coração brasileiro” e reforça a força do sentimento: “o cérebro perdeu o mundo no século XIX; o coração salvá-lo-á no século XX”. Tem o vaticínio sobre o Brasil: “caber-lhe-á, forçosamente, um grande e formoso papel na redenção do mundo que se prepara nos misteriosos laboratórios do século”.

Cláudio Bueno da Silva não considera Humberto de Campos um materialista clássico: “se dizia cético, é curiosa a sua insistência em tratar dos assuntos transcendentais, místicos, religiosos, cuidando da vida e da morte. […] usava a ironia para disfarçar certo interesse recôndito. […] O ceticismo em Humberto de Campos talvez não tivesse raízes tão profundas”.

O autor destaca que as crônicas do livro Sombras que sofrem, publicado no ano da desencarnação de Humberto de Campos, em 1934, mostram este último “preocupado em ajudar o próximo com as melhores ‘armas’ de que dispunha e que manejava muito bem: as palavras e as ideias”.

O escritor humano autodidata, muito culto, sofrido e interessado no próximo, passa a escrever pela psicografia de Chico Xavier e poucos meses após sua desencarnação. Foi um grande impacto para a população, pois se tratava de um autor muito conhecido e respeitado no Brasil. O fato motivou um rumoroso processo judicial, movido por familiares de Humberto de Campos. O episódio, com a absolvição do médium e da Editora, gerou muitas notas na imprensa da época, contribuindo para a difusão do Espiritismo. E o autor espiritual passou a adotar o pseudônimo de Irmão X, adaptado do antigo pseudônimo Conselheiro XX.

O autor espiritual Humberto de Campos mantém muitas nuances do estilo e dos focos das obras do autor enquanto encarnado. Este fato Cláudio Bueno da Silva chama atenção no seu livro.

Corroboramos o destaque que Cláudio fez aos livros psicografados por Chico Xavier. Destacamos que o autor espiritual escreveu obras pelo médium Chico Xavier, doze publicadas pela FEB (entre 1937 e 1969): Crônicas de além-túmulo; Brasil, coração do mundo, pátria do evangelho; Novas mensagens; Boa nova; Reportagens de além túmulo; Lázaro redivivo; Luz acima; Pontos e contos; Contos e apólogos; Contos desta e doutra vida; Cartas e crônicas; Estante da vida; pela Editora CEU: Relatos da vida (1988), e, pela Editora Boa Nova: Histórias e anotações (2010).

Resenha do livro: Silva, Cláudio Bueno. O menino livre de Miritiba. Humberto de Campos. 1.ed. Araras: IDE. 2018. 319p.

(*) Ex-presidente da FEB e da USE-SP.

O papel de Paulo de Tarso

O papel de Paulo de Tarso

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Em nosso livro Epístolas de Paulo à luz do Espiritismo, analisamos a trajetória do Apóstolo e comentamos os aspectos morais de suas Epístolas.1 Em outra obra, também de O Clarim, inserimos Paulo no contexto do Cristianismo primitivo.2

Eis uma síntese relacionadas com as duas obras citadas.

Na monumental obra Paulo e Estêvão3, psicografada por Francisco Cândido Xavier, o autor espiritual Emmanuel aprofunda os registros de Atos e das Epístolas de Paulo detalhando as lutas e humilhações do doutor Saulo de Tarso, autoridade na Lei Moisaica perante seu povo. Paulo que renunciou às suas prerrogativas de doutor da Lei ao iniciar seu processo de transformação no Apóstolo do Cristo foi submetido pelos seus antigos pares e até por seguidores do Cristo, a constrangimentos e dificuldades acerbas. Paulo de Tarso, como principal divulgador da mensagem do Mestre, fundou em muitos locais as chamadas igrejas cristãs (ecclesia – local de reunião, atualmente significando “igreja”). Outra ação importante foram as epístolas, com características de carta redigida por um autor antigo e de crônicas a respeito de determinados assuntos, com muitas orientações aos grupos cristãos pioneiros.

O papel e a proeminência de Paulo é discutida pelo historiador e teólogo, ligado ao catolicismo, Joseph Ernest Renan (1823 – 1892). Para esse autor, Paulo é um homem eminente e, na fundação do cristianismo, desempenhou um dos papéis de mais relevo. Renan admite que “Paulo deixou escrituras valiosas; as dos outros apóstolos não podem ombrear com elas em importância ou em autenticidade.2

Emmanuel, no livro Paulo e Estêvão, relata também que Paulo estava preocupado por não poder atender a todas as solicitações das “igrejas” nascentes. Em uma meditação noturna, recebe a seguinte orientação: "Não te atormentes com as necessidades do serviço. É natural que não possas assistir pessoalmente a todos, ao mesmo tempo […] Poderás resolver o problema escrevendo a todos os irmãos em meu nome; os de boa vontade saberão compreender, porque o valor da tarefa não está na presença pessoal do missionário, mas no conteúdo espiritual do seu verbo, na sua exemplificação e na sua vida. Doravante, Estêvão permanecerá mais aconchegado a ti, transmitindo-te meus pensamentos…”3

Daí o título da obra de Emmanuel, destacando o Apóstolo e o primeiro mártir do Cristianismo, espiritualmente na posição de seu orientador para a difusão do Cristianismo.

Paulo percorreu as capitais provinciais do Oriente romano: Antioquia, capital da Síria; Pafos, capital de Chipre; Tessalônica, capital da Macedônia; Corinto, capital da Acaia; Éfeso, capital da província da Ásia Menor. E chegou a Roma, capital do Império Romano.

Para o filósofo espírita Herculano Pires: “Paulo, que exemplifica o drama da transição da consciência judaica para a cristã, adverte que Deus não deseja cultos externos, semelhantes aos dedicados às divindades pagãs, mas "um culto racional", em que o sacrifício não será mais de plantas ou animais, mas da animalidade, ou seja, do ego inferior do homem. A religião se depura dos resíduos tribais, despe-se dos ritos agrários e da complexidade que esses ritos adquiriram no horizonte civilizado. Torna-se espiritual. Os próprios apóstolos do Cristo não compreendem de pronto essa transição. Pedro chefia o movimento que Paulo chamou "judaizante", tendendo a fazer do Cristianismo uma nova seita judaica. Mas Paulo é a flama que mantém o ideal do Cristo. Inteligente e culto, é um dos poucos homens capazes de compreender a nova hora que surge, e por isso o Cristo o retira das hostes judaicas, para colocá-lo à frente do movimento cristão.”4

O apóstolo Paulo gozava de condições e características ímpares: nasceu em família judia, com boas condições financeiras; sua terra natal Tarso, era importante centro da cultura grega, onde ele passou sua infância e adolescência; herdou do pai a cidadania romana; estudou em Jerusalém com o conhecido mestre Gamaliel, tornando-se doutor da Lei, ou seja, foi um fariseu ortodoxo. Portanto, era culto, conhecia a cultura grega e o judaísmo e o contexto do Império Romano. Era enérgico e aguerrido. Paulo era portador da chamada “autonomia intelectual”.

Destacamos que um conjunto de condições fez de Paulo um fiel e ardoroso divulgador das propostas do Cristo e com autoridade para combater e esclarecer sobre as chamadas heresias, infiltrações de ideias confusas e os oportunismos que ameaçavam os primeiros grupos cristãos. Em função dessas situações ele registrou muitas recomendações em suas Epístolas dirigidas a grupos e lideranças cristãs. Se antes ele era o fiel fariseu ortodoxo, ele se transformou no fiel e ardoroso seguidor do Cristo.

De fato, Paulo continuadamente registrava em suas Epístolas sua posição de não aceitar mais a Lei de Moisés e de se antepor aos chamados legalistas. O ex doutor da Lei se insurgia contra as regras e normas típicas de sua antiga religião tradicional. Nos textos do autor espiritual Emmanuel, Paulo foi considerado “o agricultor humano que conseguiu aclimatar a flor divina do Evangelho sobre o mundo.”5

Sem dúvida, o apóstolo Paulo foi o maior divulgador e o principal consolidador do cristianismo. Concordamos com a opinião de muitos autores de que sem Paulo não teríamos o movimento cristão.

Referências:

1. Carvalho, Antonio Cesar Perri. Epístolas de Paulo à luz do espiritismo. Cap. 2. 1.ed. Matão: O Clarim. 2016.

2. Carvalho, Antonio Cesar Perri. Cristianismo nos séculos iniciais. Análise histórica e visão espírita. Cap. 2.5. 1.ed. Matão: O Clarim. 2018.

3. Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Paulo e Estêvão. Brasília: Ed. FEB. 2012. 488p.

4. Pires, José Herculano. O espírito e o tempo. 1a Parte, Cap. V. São Paulo: Ed. Pensamento. 1964.

5. Tavares, Clóvis. Amor e sabedoria de Emmanuel. 12.ed. Cap. 4 e 5. Araras: IDE, 2007.

Antuza – médium e exemplo de vida em Uberaba

Antuza – médium e exemplo de vida em Uberaba

Uma das páginas mais luminescentes da Doutrina Espírita em Uberaba e também em toda a vasta região do Triângulo Mineiro, chamava-se Antuza Ferreira Martins. Filha de Manoel Ferreira Martins e D. Júlia Maria do Espírito Santo, nasceu em uma fazenda nos arredores de Uberaba, no dia 09 de setembro de 1902.

Aos 4 anos, acometida de meningite, foi desenganada por muitos médicos, tendo, em conseqüência, ficado surda e perdido o sentido da fala.

Posteriormente, mudou-se com a família para Uberaba. Antuza, segundo Erenice sua irmã a quem carinhosamente chamávamos de Nice, desde pequena via os espíritos. Cresceu dentro de um clima psíquico que não compreendia, nem mesmo os familiares, posto que ninguém na família era espírita. Quando completou 15 anos, em 1917, a família transferiu-se para Sacramento, cidade que, desde 1904, se transformara em ponto central do Espiritismo em todo o Brasil, pelo trabalho que vinha desempenhando o inesquecível EURÍPEDES BARSANULFO. Em lá chegando Antuza foi levada pela mãe à presença de Eurípedes, o qual, ao vê-la, foi logo dizendo da tarefa que deveria desempenhar no campo da mediunidade. Tornaram-se, a partir daí, espíritas.

Durante alguns meses, quase dois anos, Antuza trabalhou lado a lado de Eurípedes Barsanulfo, ora ajudando na limpeza da farmácia, ora auxiliando na manipulação dos medicamentos homeopáticos. Com esse estágio espiritual , junto ao grande Missionário da Caridade, Antuza equilibrou-se, aprendeu a viver dentro de suas limitações, a comunicar-se por meio de sinais e as suas faculdades psíquicas ampliaram-se dando-lhe extraordinária lucidez. Quando Eurípedes desencarnou, em 1918, ela e a família mudaram-se definitivamente para Uberaba.

Mas, antes disso, ainda em Sacramento, Antuza encontrava-se desconsolada com a partida do Benfeitor para o Plano Espiritual e chorava muito. Através da mímica e de algumas poucas palavras que com o tempo aprendeu a articular, conta-nos ela que, certo dia, quando, em prantos, ouviu uma voz a chamar-lhe: – “Antuza, Antuza!..” Ela, assustada, ao voltar-se, percebeu Eurípedes pairando no ar a dizer-lhe ainda: – ;Não chore. Você precisa trabalhar muito! . .

Quando ainda morava em fazenda, uma criança foi levada pela mãe até Antuza para ser “benzida”. a criança estava muito mal, com o abdome muito dilatado. Antuza conversou com os espíritos (via-se que ela estava ouvindo e respondia, com gestos e com balbucios a alguém invisível), estendeu as mãos com as palmas para cima e da espiritualidade desceu uma quantidade grande de fluido esverdeado e luminoso (a irmã mais velha de Antuza era médium e viu essa massa fluídica). Antuza modelou essa massa com as mãos e colocou sobre o abdome da criança, massageando de leve. O abdome da criança foi diminuindo e em poucos dias ela estava saudável.

Quando a família se instalou em Uberaba, contava ela 17 anos e começou a frequentar o tradicional Ponto ;Bezerra de Menezes , em casa de Da Maria Modesto Cravo. Numa das reuniões do Ponto, Antuza recebeu instruções sobre a sua missão do espírito de Santo Agostinho que seria, durante toda a sua vida, seu protetor. Note-se que através da psicofonia de Da Maria Modesto, todos os presentes ouviram a comunicação, inclusive Antuza que, apesar de surda, ouvia os espíritos. Por essa época, Antuza começou a transmitir passes, cuja mediunidade curadora, coadjuvada pela vidência, audição, desdobramento e efeitos físicos, foi empregada para ajudar aos necessitados com raro discernimento evangélico.

Antes de passar a atender em sua própria casa, num galpão construído nos fundos, trabalhou como médium no C. E. Uberabense, Sanatório Espírita e na Comunhão Espírita Cristã, logo que Chico Xavier se transferiu para Uberaba. A seu respeito, o nosso estimado Chico já se pronunciou em diversas ocasiões, tendo, inclusive, afirmado trazer Antuza o remédio nas mãos. Quando homenageado na Capital do Estado, Chico disse que existia em Uberaba uma senhora que, no anonimato de seu trabalho em favor dos que sofrem, deveria ali estar sendo alvo das homenagens prestadas a ele, que reconhecia não as merecer, de forma alguma, e citou o nome de Antuza Ferreira Martins!

Em sua própria casa e depois no “Barracão”, recebia extensa fila de pessoas, entre crianças e adultos. Quantas vezes, após exaustiva concentração, Antuza nos descrevia o problema orgânico, ou espiritual, de quem lhe buscava o concurso carinhoso e abnegado! Uma senhora obsedada foi trazida amarrada para a casa onde morava Antuza. Era necessário, mesmo assim que várias pessoas a segurassem, ela se debatia e retorcia constantemente. Antuza entrou em prece e daí a pouco uma médium vidente presente viu uma luz vinda de muito alto descer e tomar a forma de Eurípedes Barsanulfo. Este, incorporado na médium, disse “boa noite, irmãos” e os espíritos que subjugavam aquela senhora afastaram-se imediatamente. Aí Eurípedes pediu que desamarrassem e soltassem a mulher. Ela se tornou imediatamente lúcida e curada daquela obsessão. Uma moça vinda do estado de Mato Grosso chegou até a casa da Antuza andando de “quatro”, isto é como um quadrúpede, sem falar e sem consciência de si mesmo. A família já havia procurado inúmeros médicos sem resultados. Antuza “conversou” com o espírito que a obsedava, fez gestos indicando a ele que se retirasse, fosse embora e em alguns minutos a moça se levantou e perguntou ao pai que a acompanhava: onde estamos? O que estamos fazendo aqui? Na sessão de desobsessão que ocorria à noite, no Barracão, dois espíritos vingadores da moça foram doutrinados: haviam sido torturados e mortos por ordem dela, quando eram seus escravos e a perseguiam desde então. Faziam-na ficar como um animal e montavam sobre ela, fazendo-a conduzi-los no “lombo”, entre outras coisas.

Além das atividades mediúnicas Antuza ajudava nas tarefas da casa, ao lado de sua irmã Erenice, irmãos e de seus sobrinhos que vieram morar com eles. Fazia tapete de crochê usando cordões cortados de malhas; esses tapetes eram vendidos e o dinheiro era usado para comprar algumas coisas para seu uso pessoal, presentes, brinquedos e outras necessidades.

Conta-nos Nice (intérprete de Antuza para os que não se familiarizam com a sua maneira de; falar com as pessoas) que, certa vez, uma mulher, chorando muito e extremamente desesperada, ao receber o passe, é indagada pela médium se tinha bebido alguma coisa corrosiva, pois o interior dela estava parecendo Ainda em lágrimas, a infeliz irmã lhe diz que, tempos atrás, havia ingerido soda cáustica (!) e ainda sentia fortes dores, encontrando dificuldade de alimentar-se normalmente. Para que tenhamos uma idéia da presença dos espíritos na vida de Antuza, vejamos o que ocorreu quando ainda era criança. Ela e a mãe, morando na fazenda, foram até a horta colher legumes e sua mãe a deixou um pouco para trás; nisto, surge uma cobra prestes a picar a menina. Ela ficou como que hipnotizada e, como não falava, não tinha como gritar por socorro. Eis quando, ao seu lado, um espírito, com aspecto de padre, a pega pelos braços e lhe dá um violento impulso, distanciando-a, assim, do peçonhento réptil. Antuza começa a chorar e sua mãe, correndo, chama alguns lavradores, os quais dão cabo da enorme serpente.

Dr. Henrique Krüger, médico uberabense, Agostinho, Eurípedes Barsanulfo e muitos outros a quem não conhece pelo nome, são os espíritos que lhe assistem o trabalho cristão ao qual devotou a própria vida.

Por volta de 1979, Antuza que ainda enxergava, porém surda e muda, vivia em Uberaba na companhia dos irmãos Euphranor e Erenice; e, aos domingos, como de costume, almoçava na casa do sobrinho Antônio Carlos, o qual possuía um piano francês. Antuza era capaz de ver dentro do corpo das pessoas, a doença que tinha ou não tinha; fazia curas à distância, especialmente à noite. Após a refeição, Antuza se dirigia para a sala onde se encontrava o piano, e acomodando-se em uma poltrona, permanecia imóvel por mais de uma hora. Depois, levantando-se, vinha dizer em seu modo característico (gestos e fala precária) que Frederico, um rapaz muito bonito, estava tocando piano para ela; e que sua música era maravilhosa. Tai fato se repetiu por anos, e era de conhecimento de toda a família. Certa vez, em visita a outro sobrinho: Euphranor Jr., que era professor de História e possui uma bela biblioteca em sua casa; este entregou à Antuza um belo exemplar de um livro sobre os maiores compositores da musica clássica (nota-se que tal livro continha fotografias de todos compositores, os quais, já haviam desencarnado). Enquanto Antuza folheava o livro, Euphranor Jr. ia lhe perguntando se ela conhecia as pessoas das fotos, o que lhe era negado: “Não…,não…, não!” Em dado momento, diante da foto do grande músico Frederico Chopin ela se manifestou por gestos: É ele! Frederico, o moço que toca piano para mim”.

Como Eurípedes, Antuza igualmente casou-se com os mais pobres doando-se inteiramente ao serviço cristão, na edificação do Reino de Deus no coração das criaturas. Em seus lábios, a palavra ;trabalhar (uma das poucas que conseguia articular com certa nitidez) soava de maneira diferente: é imperiosa e definitiva! Por mais de 70 anos ela exerceu seu legítimo mandato mediúnico E não são poucos os que, através de suas abençoadas mãos, receberam o amparo do Mais Alto. Antuza foi um dos expoentes do Espiritismo em Uberaba. Muitos artistas de televisão vinham visitá-la, inclusive Dercy Gonçalves. Em seu humilde recanto de trabalho, sobre tosca mesa de madeira, cujos pés estão fincados no piso, um único livro: O Evangelho Segundo o Espiritismo o qual, de quando em quando, solicitava a um dos colaboradores ler uma página.

Nos últimos seis anos de existência física, Antuza ficou cega, agravando as suas limitações físicas e no dia 30 de julho de 1996, aos 94 anos incompletos, desencarnou em Uberaba, em decorrência de complicações naturais da idade avançada. Antuza, uma baixinha; de um metro e alguns quebrados de altura, mas um espírito gigante na seara evangélica foi, sem dúvida alguma, uma das mais legítimas representantes da mediunidade com Jesus! Um exemplo a ser seguido pelos espíritas de hoje e de amanhã!…

Texto baseado no livro “O Espiritismo em Uberaba”, no “Anuário Espírita 1997", em um “Boletim Informativo” da AME Uberaba e em informações pessoais de parentes. Texto divulgado por Donda.

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(Nota: tivemos a oportunidade de ir à casa de Antuza algumas vezes, em momentos que visitávamos Chico Xavier, nos anos 1970 e 1980. Cesar Perri)

Valorização da vida

Valorização da vida em Setembro

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Internacionalmente o mês de Setembro é chamado amarelo! Em geral, a cor amarela remete a ideias de sol, verão, prosperidade e felicidade. É considerada uma cor inspiradora e que desperta a criatividade. Daí a relação com a vida e sua valorização.

A certeza de que somos espíritos reencarnados e em processo de aprimoramento é de fundamental importância para a melhor compreensão dos valores e da oportunidade da vida corpórea.

O velho conceito romano “mente sã em corpo são” (“mens sana in corpore sano”) prossegue atual.

O apóstolo Paulo anotou em sua 1ª Epístola aos Coríntios (6,20): “Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.”1

O espírito André Luiz, pelo recurso da psicografia, define com clareza o valor da vida corpórea em dois comentários: “O corpo é o primeiro empréstimo recebido pelo Espírito trazido à carne” (livro Conduta Espírita, Cap. 34.); “[…] temos necessidade da luta que corrige, renova, restaura e aperfeiçoa. A reencarnação é o meio, a educação divina é o fim” (livro Missionários da Luz, cap. 12).1

A partir dessas fundamentações cristãs e espíritas, torna-se interessante considerarmos o que representa o Espírito nos contextos íntimo e social; o equilíbrio entre corpo/espírito e melhores condições de vida. Esta última também inclui, evidentemente, o respeito com o corpo físico e a valorização da vida corpórea.

Aí se inserem as medidas preventivas para se evitar quaiquer formas de interrupção da vida, incluindo o suicídio, as enfermidades e também aquelas que favoreçam o diagnóstico precoce de doenças, evitando-se que elas sejam reconhecidas em situações tardias e danosas.

Recentemente, foi relançado o livro Em Louvor à Vida, que elaboramos em parceria com Divaldo Pereira Franco, com base em textos espirituais de autoria de nosso tio Lourival Perri Chefaly.2

Do texto desse livro com nossa parceria, em relançamento, destacamos um trecho: “Saúde e doença – binômio do corpo e da mente – são conquistas do ser, que deve aprender e optar por aquela que melhor condiz com as aspirações evolutivas, desde que a harmonia ideal será alcançada, através do respeito à primeira ou mediante a vigência da segunda.”

Evidentemente que as causas que favorecem o suicídio muitas vezes estão ligadas às questões de falta da compreensão da vida imortal, de distonias mentais e influências espirituais. Daí a importância dos estudos, palestras e seminários que possam chamar atenção a tais questões no sentido de se valorizar a existência corpórea e o processo de educação espiritual. Ou seja, implementar-se Campanhas Em Defesa da Vida.1

O autor espiritual Lourival Perri Chefaly (1927-1976), conhecido pelo apelido familiar Lôlo, foi médico na cidade do Rio de Janeiro. Como médico atuou como pediatra, cardiologista e finalmente cancerologista. Sempre manteve clínica particular e foi médico do Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro. Teve intensa atuação na Campanha Nacional de Combate ao Câncer e foi presidente do Centro de Estudos do Instituto Nacional do Câncer. Atuou na Igreja Anglicana de Botafogo. Como membro do Lyons Club-Gávea, fazia palestras educativas sobre saúde. Tornando-se espírita colaborou com a Seara dos Servos de Deus, no mesmo bairro carioca, junto à médium Dolores Bacelar. A nosso convite fez palestras espíritas em Araçatuba e região e manteve contatos pessoais com Chico Xavier e de Divaldo Pereira Franco. Lutou durante 10 anos contra insidiosa enfermidade, demonstrando fé e serenidade. Seu nome designa a Sala de Leitura e o Centro de Estudos do Instituto Nacional do Câncer. O livro Em louvor à vida traz informações nossas sobre o autor espiritual, e, comentários sobre as mensagens do Espírito, psicografadas por Divaldo Pereira Franco.

Referências:

1) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Em ações espíritas. 1.ed. Cap. Defesa da vida. Brasil sem aborto. Araçatuba: Ed.Cocriação/USE Regional. 2017.

2) Franco, Divaldo Pereira; Chefaly, Lourival Perri; Carvalho, Antonio Cesar Perri (Org.). Em louvor à vida. 2.ed. Salvador: LEAL. 2017, p.52.

(*) Foi dirigente de instituições espíritas em Araçatuba (SP) e também presidente da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo e da Federação Espírita Brasileira.

Vultos espíritas desencarnados com atuação na política

Vultos espíritas desencarnados com atuação na política

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Como desdobramento de artigo que publicamos no jornal Dirigente espírita1 elaboramos uma relação de alguns vultos, já desencarnados, que foram líderes políticos de projeção municipal, estadual e nacional, e mantiveram vinculação com ações espíritas. Evidentemente que não é completa, sendo mais voltada para o momento e o local da mesa redonda “Espiritismo e Política”2:

Adolfo Bezerra de Menezes (1831-1900), como político atuou na Capital Imperial, deputado junto à Assembléia Nacional do Império, Presidente da Câmara de Vereadores acumulando o exercício do Poder Executivo Municipal do Rio de Janeiro; lutou pela emancipação dos escravos negros, através de projeto de lei, procurou regulamentar o trabalho doméstico, visando conceder a essa categoria, inclusive, o aviso prévio de 30 dias; denunciou os perigos da poluição; atuou em empresas governamentais; foi presidente da FEB em dois períodos, autor de livros espíritas.

Francisco Leite de Bittencourt Sampaio (1834-1895), como político atuou na Capital Imperial, deputado junto à Assembléia Nacional do Império, presidente da província do Espírito Santo; um dos fundadores do Partido Republicano; foi o primeiro diretor da Biblioteca Nacional em seguida à proclamação da República; um dos fundadores de centros espíritas pioneiros na cidade do Rio de Janeiro; autor de livro espírita e de letras de canções musicadas por Carlos Gomes.

Eurípedes Barsanulfo (1880-1918) foi vereador em Sacramento (MG), fundador do Colégio Allan Kardec, de centro e de farmácia; atuou como médium.

Guilherme Taylor March (1838-1922) foi vereador e Presidente da Câmara de Vereadores acumulando o exercício do Poder Executivo Municipal de Niterói (RJ); dedicou-se ao atendimento médico da população, especificamente com a prática da homeopatia, sendo chamado o “pai dos pobres”; era espírita declarado.

Aristídes de Souza Spínola (1850-1925), como político foi deputado provincial pela Bahia e depois atuou na Capital Imperial, deputado junto à Assembléia Nacional do Império; abolicionista; e com um mandato de deputado no período republicano; presidente da província de Goiás; foi presidente da FEB.

Cairbar de Souza Schutel (1868-1938) foi vereador e o primeiro prefeito de Matão (SP), no ano de 1898; fundou o Centro Espírita Amantes da Pobreza, o jornal O Clarim, a Revista Internacional de Espiritismo e é autor de vários livros. Em pleno período de exceção do governo Vargas insere-se na “Campanha Pró-Liberdade de Consciência” e na “Coligação Pró-Estado Leigo”.

Camilo Rodrigues Chaves (1884-1955) foi vereador, deputado e senador do antigo Congresso Mineiro (em Constituição antiga previa-se o sistema bicameral nos Estados); presidente da União Espírita Mineira e autor de livro espírita.

Romeu de Campos Vergal (1903-1980), originário da pioneira União da Mocidade Espírita de São Paulo, foi deputado junto à Assembléia Constituinte de São Paulo, deputado federal por várias legislaturas, lutou pelo projeto “O Petróleo é Nosso”, foi líder partidário na Câmara dos Deputados; atuou na União Federativa Espírita Paulista, na Liga Espírita do Estado de São Paulo, dirigente da Sociedade Rádio Piratininga-PRH-3, a qual lançava ao ar diariamente o "Programa Radiofônico Espírita Evangélico do Brasil", atuou em instituições espíritas de Serra Negra (SP); autor de livros espíritas.

Francisco Carlos de Castro Neves (1914-1974), deputado junto à Assembléia Constituinte de São Paulo; deputado federal; presidente da Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC); secretário de Governo do Estado de São Paulo e também ministro do Trabalho e Previdência Social, nas gestões de Jânio Quadros, como prefeito (1ª. gestão), governador e presidente da República; foi o 2º. presidente da União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo (USE-SP).

Emílio Manso Vieira (1915-1978), foi vereador em São Paulo, foi ligado à União Federativa Espírita Paulista, à FEESP e à USE-SP; autor de livros espíritas.

Eurípedes de Castro (1920-1974). Em 3 de outubro de 1952, Eurípedes de Castro, representando a entidade União Evolucionista Cristã, se dirigiu a Pedro Leopoldo, Minas Gerais, com o objetivo de saber, por meio de Chico Xavier, a opinião de Emmanuel a respeito da participação dos espíritas na política, tendo recebido uma mensagem. Foi deputado estadual em São Paulo; ligado a centros e atuou no Conselho Deliberativo Estadual da USE-SP.

José de Freitas Nobre (1921-1990), vice-prefeito e vereador da cidade de São Paulo; deputado federal em várias legislaturas; na Câmara dos Deputados foi líder partidário e da oposição ao regime militar; um dos fundadores de centro espírita e do jornal Folha Espírita; apoiou a fundação da Associação Médico Espírita de São Paulo; amigo pessoal de Chico Xavier; coordenou a Comissão Pró-Indicação de Chico Xavier ao Prêmio Nobel da Paz, em 1981; autor de obras espíritas.

Jorge Cauhy Júnior (1924-2005), Deputado Distrital no Distrito Federal, fundador do Lar dos Velhinhos Maria Madalena, no Núcleo Bandeirante, em Brasília.

Alberto Calvo (1928-2013) foi vereador e deputado estadual em São Paulo; sub-prefeito do bairro Casa Verde; ligado a centros, entidades assistenciais, Rádio Boa Nova e à USE-SP. Nossa gratidão pelo esforço e dedicação, e, homenagens aos vultos citados. Com certeza representam muitos outros cidadãos de várias partes do Brasil.

Citações:

1) Carvalho, Antonio Cesar Perri. O movimento espírita e a política. Dirigente espírita, USE-SP. Ano 28. N.166. P. 6. São Paulo, julho-agosto de 2018.

2) Texto apresentado durante a Mesa Redonda Espiritismo e Política, realizada na Câmara Municipal de São Paulo no dia 4 de agosto de 2018: http://grupochicoxavier.com.br/mesa-redonda-espiritismo-e-politica-e-manifesto-espiritas-na-politica/

(*) Ex-presidente da USE-SP e da FEB.

Transcrito de: Revista Internacional de Espiritismo. Ano XCIII. No. 8. Setembro de 2018.

Bezerra de Menezes – Alguns momentos políticos e espíritas

Bezerra de Menezes – Alguns momentos políticos e espíritas

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Adolfo Bezerra de Menezes Cavalcanti nasceu aos 29 de agosto de 1831 e desencarnou aos 11 de abril de1900.

Atuou na Capital Imperial e no início de suas atividades, pela sua dedicação foi cognominado “médico dos pobres”. Exerceu o mandato como deputado junto à Assembléia Nacional do Império, Presidente da Câmara de Vereadores acumulando o exercício do Poder Executivo Municipal do Rio de Janeiro. Como político lutou pela emancipação dos escravos; através de projeto de lei, procurou regulamentar o trabalho doméstico, visando conceder a essa categoria, inclusive, o aviso prévio de 30 dias; denunciou os perigos da poluição; atuou em empresas governamentais.1

Como médico e já adotando o conhecimento espírita escreveu um livro marcante: A loucura sob novo prisma2, muito relacionado com a problemática vivida por um filho seu.

Bezerra foi o 2º. presidente da FEB (1889), mas preferiu não continuar com o encargo. Retornou numa época de crise, como o 5o presidente (1895-1900). Houve vacância do cargo com a renúncia do presidente e face a negativa do vice-presidente Dias da Cruz em assumir, houve nova eleição, sendo sido eleito. Em realidade acabou atendendo a insistentes pedidos inclusive do Dr. Bittencourt Sampaio face as dissensões reinantes no seio do Espiritismo brasileiro. Bezerra estava cansado, doente, abatido pela dissensão entre os irmãos espíritas, mas acabou aceitando o convite. “Com a perspectiva de poder conciliar a grande família espírita em torno do ideal cristão, o venerando ancião prometeu pensar”. Em vista da relutância dele em assumir aquele espinhoso encargo, travou-se a seguinte conversação:

“Bezerra: Querem que eu volte para a Federação. Como vocês sabem aquela velha sociedade está sem presidente e desorientada. Em vez de trabalhos metódicos sobre Espiritismo ou sobre o Evangelho, vive a discutir teses bizantinas e a alimentar o espírito de hegemonia.

Bittencourt Sampaio: O trabalhador da vinha é sempre amparado. A Federação pode estar errada na sua propaganda doutrinária, mas possui a Assistência aos Necessitados, que basta por si só para atrair sobre ela as simpatias dos servos do Senhor.

Bezerra: De acordo. Mas a Assistência aos Necessitados está adotando exclusivamente a Homeopatia no tratamento dos enfermos, terapêutica que eu adoto em meu tratamento pessoal, no de minha família e recomendo aos meus amigos, sem ser, entretanto, médico homeopata. Isto aliás me tem criado sérias dificuldades, tornando- me um médico inútil e deslocado que não crê na medicina oficial e aconselha a dos Espíritos, não tendo assim o direito de exercer a profissão.”3

Durante sua gestão, em 15/11/1897, Pierre-Gaëtan Leymarie concedeu à Federação Espírita Brasileira na pessoa de seu presidente Doutor Adolfo Bezerra de Menezes ou seus sucessores “os direitos exclusivos às traduções portuguesas, tanto no Brasil como em Portugal”, das obras de Allan Kardec e “os quarenta volumes da Revue Spirite”. Anulava concessões anteriores. Esse documento teve a firma reconhecida de Leymarie e depois Consulado do Brasil em Paris reconheceu a firma da autoridade francesa que reconheceu a firma de Leymarie. Entre as obras estava a 5ª. edição francesa de A gênese. Nesse documento de cessão não há especificação da validade temporal do mesmo, mas evidentemente que caducou quando as obras de Kardec caíram no domínio público.3

Bezerra propunha a ideia da união dos espíritas e destacou em 1896 em uma série de artigos em Reformador intitulada “Os tempos são chegados”: “A organização […] pela união dos espíritas e segundo uma orientação uniforme.”4

Mas, as ações práticas começaram a se concretizar com o seu substituto, o presidente Leopoldo Cirne.

Referências:

1) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Vultos espíritas desencarnados com atuação na política. Revista internacional de espiritismo. Setembro de 2018. No prelo.

2) Menezes, Adolfo Bezerra. A loucura sob novo prisma. Ed.FEB.

3) Carvalho, Antonio Cesar Perri. União dos espíritas. Para onde vamos? 1.ed. Capivari: Ed. EME. 2018. 144p.

4) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Primeiros tempos da FEB: de Ewerton de Quadros a Bezerra de Menezes. Ano 132. N. 2.218. Janeiro de 2014. Reformador. p. 5-8.

(*) – Ex-presidente da USE-SP e da FEB.

ESPIRITISMO E POLÍTICA

ESPIRITISMO E POLÍTICA

Aylton Paiva*

Também no livro A Gênese, de Allan Kardec, encontramos o esclarecimento:

“O Espiritismo não criou a renovação social, pois a maturidade da humanidade faz dessa renovação uma necessidade. Por seu poder moralizador, por suas tendências progressivas, pela elevação de seus propósitos, pela generalidade das questões que ele abraça, o Espiritismo está, mais que todas as outras doutrinas, apto a secundar o movimento regenerador. Por isso que é contemporâneo.Surgiu no momento em que podia ser útil, pois para ele também os tempos são chegados”. (A Gênese, os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo, de Allan Kardec ― ed. FEAL).

Destaca-se, então, o compromisso do espírita com uma nova ordem social, fundada no Direito e no Amor. Obviamente, essa transformação dependerá da ação consciente dos bons e ao lado deles, os espíritas atuando com uma “consciência política“, fundamentada nos princípios éticos das Leis Morais de O Livro dos Espíritos.

Portanto, não pode o espírita alienar-se da sociedade e deve agir, com conhecimen‑ to e amor, nessa transformação, em importante momento histórico da civilização humana:

“Aproxima-se o tempo em que se cumprirão as coisas anunciadas para a transformação da Humanidade”. (O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. XX, item 5º)

Observando a ousadia da maldade e a confusão entre bondade e omissão, Allan Kardec indagou aos Espíritos:

“Por que, no mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons?”. ― Por fraqueza destes. Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quando estes o quiserem, preponderarão.” (Questão 932 de O Livro dos Espíritos ― Ed. FEB)

A resposta é clara e precisa, não permite dúvidas àqueles que pretendem ser bons. O mundo e, especificamente, a estrutura social brasileira, está precisando de transformações urgentes para coibir a ação dos maus que solapam os bons costumes, que semeiam a miséria, que se utilizam dos instrumentos da corrupção, da fraude e da mentira para atingirem seus objetivos egoísticos e antiéticos.

Momento significativo para a transformação da sociedade é a realização de eleições para os poderes Legislativo e Executivo.

Em breve seremos chamados às urnas. O espírita precisa estar consciente da sua responsabilidade nesse momento, seja pleiteando cargos eletivos, seja indicando seu representante para assumir esses cargos.

O voto é uma procuração que se passa ao candidato para que, se eleito, ele aja em nosso nome a bem da coletividade. É a maior manifestação de amor e respeito ao povo. Não votar, anular o voto, omitir-se é apoiar as forças do mal, é permitir que os maus sobrepujem os bons.

Para que o espírita tenha critérios de avaliação do candidato analise a sua conduta como membro de uma família, no exercício da atividade profissional, o seu interesse e envolvimento em ações comunitárias com os princípios contidos em O Livro dos Espíritos ― 3ª Parte ― Das Leis Morais, onde estão os conceitos sobre: o Bem e o Mal, a Sociedade, o Trabalho, o Progresso e a Igualdade, Justiça e o Amor.

Não se deve levar as questões político- partidárias para dentro do Centro ou Instituição Espírita. Estas devem ser debatidas no seio da sociedade, mas o espírita deve estar consciente e responsável nas aplicações dessas questões, visando sempre o bem comum.

Vote consciente.

VOTE COM AMOR!

*Aylton Paiva é da USE Intermunicipal de Lins.

(transcrito do jornal Dirigente Espírita, USE-SP, N. 166. Junho-Julho de 2018, p.7.

O porquê do estudo de A gênese

O porquê do estudo de A gênese

Opiniões e manifestações espirituais devem ser analisadas com base nos critérios da lógica, do bom senso e, inclusive, dados concretos disponíveis.

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Os 150 anos da publicação de A gênese: os milagres e as predições segundo o Espiritismo estão sendo assinalados por momentos de polêmica a respeito de suas edições francesas iniciais.

A gênese foi lançada por Allan Kardec em janeiro de 1868, sendo por ele reeditada mais duas vezes nos mesmo ano e tendo a 4ª. edição lançada em fevereiro de 1869. Portanto, até a desencarnação do Codificador este havia lançado quatro edições da citada obra. Atendendo à exigências do governo francês submeteu a primeira edição ao Ministério do Interior, que após a liberação, foi depositada na Biblioteca atualmente conhecida como Biblioteca Nacional da França. Para as duas outras edições de 1868 e a edição de fevereiro de 1869, Allan Kardec apenas informou que teriam o mesmo conteúdo da edição original.

Em dezembro de 1872, a Sociedade Anônima para a Continuação das Obras Espíritas de Allan Kardec, lançou a 5ª. edição, que precisou passar pelos trâmites oficiais de registro, pois se tratava de uma “edição revisada, corrigida e aumentada”. Livros e revistas em francês das últimas décadas do século XIX já traziam matérias sobre as polêmicas e contradições relacionadas com a citada Sociedade Anônima, as deturpações ocorridas em A gênese e a alteração da linha editorial nas edições da Revista Espírita após a desencarnação de Kardec. É sabido que essa Sociedade Anônima concedeu ainda no século XIX a várias instituições – inclusive do Brasil – a autorização para a tradução da 5ª. edição francesa. Porém, estas concessões caducaram quando as obras de Allan Kardec caíram no domínio público. Pela legislação francesa da época, seriam 50 anos após a morte do autor.

Desde fatos ocorridos no 2º. semestre de 2017, como o alerta e posição firme e clara da Confederação Espírita Argentina, com informações, publicação da obra El legado de Allan Kardec e da nova tradução para o espanhol da 1ª. edição francesa de A gênese, ocorrem repercussões em nosso país.

No início de março de 2018, a União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo realizou o seminário “A gênese. O resgate histórico” com atuação de Simoni Privato Goidanich, oportunidade em que lançou a tradução para o português de sua obra O legado de Allan Kardec.1 Há quase dez anos já existia uma tradução para o português da 4ª. edição francesa (de 1868) de A gênese, editada pelo Centro Espírita Léon Denis (CELD), do Rio de Janeiro. Em maio de 2018 a Fundação Espírita André Luiz (FEAL), de São Paulo, lançou a tradução para o português da 1ª. edição francesa de A gênese. Alguns países já lançaram traduções de A gênese com a mesma base.

Algumas pessoas e instituições prosseguem na defesa das traduções da 5ª. edição francesa da citada obra e circulam textos variados. Aliás, todas Editoras do Brasil comercializam a citada versão; as únicas exceções são as Editoras do CELD e da FEAL.

A União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo divulgou Manifesto de sua Diretoria Executiva, recomendando “a adoção da 4ª edição francesa (cujo conteúdo é idêntico às três edições anteriores) e suas respectivas traduções do livro A Gênese: os milagres e as predições segundo o Espiritismo como a obra de referência doutrinária, cuja autoria pode ser atribuída, sem qualquer dúvida, a Allan Kardec”.2

Todavia, permanecem dúvidas e questionamentos para muitas pessoas e instituições, apesar dos fatos e divulgação de documentos franceses pesquisados e reproduzidos por Simoni Privato Goidanich em seu livro O legado de Allan Kardec e apresentados em vários seminários.

Evidentemente que muitos não acessaram o livro citado e podem estar agindo motivados por muitas outras razões. Alguns ficam na expectativa de manifestações dos espíritos ou de posições dessa ou daquela instituição. É natural que a dúvida ou a remoção da posição de conforto incomode, mas essa é a razão para nos debruçarmos no texto de A gênese e analisarmos as posições e recomendações do sensato e racional Codificador.

A Doutrina Espírita recomenda que as opiniões e as manifestações espirituais devem ser analisadas com base nos critérios da lógica, do bom senso e, inclusive, dados concretos disponíveis, o que abrange documentos históricos e oficiais; e da concordância com o ensino dos Espíritos. O Codificador destaca na Apresentação e no primeiro capítulo de A gênese, intitulado “Fundamentos da Revelação Espírita”: “[…] pedimos uma atenção rigorosa para esse ponto, porque é aí que se encontra, de algum modo, o nó da questão. Não obstante a parte que toca à atividade humana na elaboração dessa Doutrina, a sua iniciativa pertence aos espíritos, ela, porém, não é formada da opinião pessoal de cada um deles; ela não é, e nem pode ser, mais que o resultado do seu ensino coletivo e concordante. Somente nessa condição, ela pode se dizer a Doutrina dos Espíritos, de outra forma seria apenas a doutrina de um espírito, e só teria o valor de uma opinião pessoal.”3,4

Ainda no capítulo inicial de A gênese o Codificador reitera: “O caráter essencial de qualquer revelação tem que ser a verdade. Revelar um segredo é tornar conhecido um fato; se é falso, já não é um fato e, consequentemente, não existe revelação. Toda revelação desmentida por fatos, não é revelação; se ela for atribuída a Deus, não podendo Deus mentir, nem se enganar, ela não pode emanar dele, é preciso considerá-la como o resultado de uma concepção humana.”3,4 E Allan Kardec reforça o papel do Espiritismo como “ciência de observação”. Pois bem, nesta condição os fatos e documentos não podem ser desprezados!

Em seu Manifesto, a USE-SP recomenda: “Promover encontros, seminários e outros meios de interação com os dirigentes e colaboradores de instituições espíritas em geral objetivando o esclarecimento sobre os fatos históricos e documentos que justificam a adoção da 4ª edição francesa e suas respectivas traduções desta obra como referência.”2

A nosso ver, o sesquicentenário de A gênese deve ser bem aproveitado pela comunidade espírita para realmente ler, estudar e refletir seu conteúdo. E para os grupos que puderem, compararem os textos da obra publicada por Allan Kardec, enquanto encarnado – da 1ª a 4ª edições -, com a 5ª. edição de 1872.

Valorizemos as Obras Básicas de Allan Kardec, efetivamente estudando-as!

Bibliografia:

1) Goidanich, Simoni Privato. O legado de Allan Kardec. 1.ed. São Paulo: USE. 2018. 446p.

2) NOTA OFICIAL – Edições do livro A Gênese: os milagres e as predições segundo o Espiritismo. São Paulo, 05/06/2018; http://grupochicoxavier.com.br/use-recomenda-sobre-a-genese/

3) Kardec, Allan. Trad. Sêco, Albertina Escudeiro. A gênese. 3.ed. Apresentação; Cap. 1. Rio de Janeiro: Ed. CELD. 2010.

4) Kardec, Allan. Trad. Imbassahy, Carlos de Brito. A gênese. 1.ed. Apresentação; Cap. 1. São Paulo: FEAL. 2018.

(*) O autor foi presidente da FEB e da USE-SP e membro da Comissão Executiva do CEI. Transcrito de: Revista Internacional de Espiritismo. Ano 93. N.7. Agosto de 2018. P. 368-9.