O filme e o estudo da vida e obra de Kardec

O filme e o estudo da vida e obra de Kardec

 Cópia de litografia feita por Aug.Bertrand

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

O filme “Kardec”, em exibição no Brasil, tecnicamente composto de forma primorosa foi produzido por Wagner de Assis e fundamenta-se no livro Kardec, de autoria de Marcel Souto Maior (Editora Record, 1ª edição em 2013).

Mas muitos ficam em dúvida sobre a veracidade de algumas cenas, ou se seriam enquadradas na chamada “licença cinematográfica”, e que inclusive não constam do livro básico para o enredo cinematográfico.

Além da biografia já citada, que não foi totalmente utilizada no enredo do filme, coincidentemente e independente de outras biografias tradicionalmente evocadas na literatura espírita, atualmente surgem muitos fatos e documentos que ampliam as informações biográficas do Codificador.

Embora existissem publicações antigas que apontavam para as deturpações na 5ª edição francesa de A Gênese lançada em 1872, mais de três anos após a desencarnação de Kardec, o assunto tomou vulto a partir de posições da Confederação Espírita Argentina, que editou em espanhol a 1ª. edição de A Gênese (de janeiro de 1868) e em outubro de 2017 levou informações para a reunião do Conselho Espírita Internacional, em Bogotá (Colômbia), e também lançou o livro El legado de Allan Kardec (**), de Simoni Privato Goidanich, que reúne documentos oficiais coletados em pesquisas junto aos Arquivos Nacionais da França e na Biblioteca Nacional da França, localizadas em Paris. Comprovou-se que apenas o exemplar da 1ª. edição de A Gênese (de janeiro de 1868), foi depositado legalmente durante a existência física de Allan Kardec na Biblioteca Nacional da França. Assim o Codificador não teria modificado o conteúdo.

Episódios históricos ficam mais claros no livro Beaucoup de Lumière (1884), de Berthe Fropo, disponibilizado em 2017 em edição digital bilíngue. A autora foi espírita fiel a Kardec, amiga e vizinha de Amélie Boudet e comenta ações polêmicas e desvirtuamentos doutrinários nas mãos de Leymarie por influência de interpretações e ideologias outras… Ainda no final de 2018, vieram a lume documentos e manuscritos franceses, publicados em artigo de Charles Kempf e Michel Buffet na edição do 4º. trimestre de 2018 da Revue Spirite e que comprovam adulterações em A Gênese após a desencarnação de Kardec.

Interessante é que tanto tempo após a desencarnação de Kardec, recentemente estão sendo valorizados documentos, periódicos e livros franceses, quase desconhecidos no Brasil, que trazem esclarecimentos sobre episódios que ficaram ocultados ou obscurecidos sobre a vida de Kardec e sua esposa, e sobre a divulgação de suas obras imediatamente após sua desencarnação.

Um Site riquíssimo de documentos franceses do Facebook: “Imagens e registros históricos do Espiritismo”, oferece dados até então não conhecidos, como a existência de uma irmã de Rivail, desencarnada na infância; a presença de uma jovem junto ao casal Rivail e Amélie, praticamente como se fosse uma “filha adotiva”, que também desencarnou na juventude; dados sobre a propriedade do casal na Villa Ségur; comprovações de adulteração de manuscrito de Kardec sobre A Gênese, posteriormente incluído em Obras Póstumas (1890); comprovação do nome verdadeiro da médium conhecida como Céline Japhet; documentos sobre a fundação da União Espírita Francesa.

Em nosso país surge o início da divulgação de manuscritos e de documentos, o Projeto “Cartas de Kardec”, riquíssimo acervo que estava em poder da família de Silvino Canuto Abreu, finalmente doados à Fundação Espírita André Luiz, de São Paulo.

O filme “Kardec”, gerando algumas dúvidas entre espectadores mais atentos, deve ser motivo de estímulo para se estudar a vida e a obra de Kardec, e, coincidentemente, em 2018 e 2019 transcorreram dois sesquicentenários, respectivamente, do lançamento de A Gênese, a última obra do Codificador, e, de sua desencarnação.

Daí, inclusive, a oportunidade de se valorizar a importante “Campanha Comece pelo Começo”, idealizada por Merhy Seba, patrocinada pela USE-SP em meados dos anos 1970 e aprovada pelo CFN da FEB em novembro de 2014.

(*) – Ex-presidente da USE-SP e da FEB; e ex-membro da Comissão Executiva do CEI.

(**) – Tradução em português editada pela USE-SP.