VALORIZAÇÃO DA VIDA – Nota da USE-SP

VALORIZAÇÃO DA VIDA – Nota da USE-SP

A sociedade brasileira está diante de um tema de muita gravidade. O Supremo Tribunal Federal, nos dias 3 e 6 de agosto, discutiu a ação ADPF 442 que trata da descriminalização completa do aborto até a 12ª semana de gestação.

É dolorido saber que mulheres, em momentos de muitas angústias e temores, procurem procedimentos abortivos que exponham sua vida a sérios riscos. Cala-nos fundo na alma pensar que há ali um coração feminino, com muitos sonhos e projetos para a vida, que sente a tristeza de vê-los frustrados. A mulher sofre em muitos casos porque o companheiro que deveria apoiá-la e ampará-la partiu ou sequer esteve verdadeiramente ao seu lado, nunca a olhou com carinho e decência. Em outros casos, sofre pelo temor da reação dos familiares e amigos, pela incompreensão e intolerância dos que convivem com ela.

Contudo, essa realidade não deve nos enregelar o coração para uma outra vida que também tem o direito de viver. Falamos aqui da criança em vias de formação. Caso o aborto dissesse respeito apenas à mulher, o papel das leis seria somente o de zelar pela integridade física e mental da mesma. No entanto, apoiados na ciência, sabemos que a questão envolve, sim, um outro ser, o embrião1, com código genético único, o que o torna um outro indivíduo e que por isso deve ter o direito à vida preservado. Sendo o abortamento2 um assassinato, a decisão por realizá-lo redunda em grave prejuízo a outrem.

Muito se fala sobre a laicidade do Estado. O Estado de fato não está comprometido com as crenças particulares de cada religião, porém, ele só pode existir em função de alguns valores fundamentais que permitem a vida em sociedade e o direito à vida é um deles.3 Sendo assim, a defesa da vida, além de uma concepção pessoal ou religiosa, é um pilar que sustenta a organização social.

Ao entendermos que junto à gestante há um outro ser que também tem direitos, somos obrigados a buscar caminhos mais adequados para o amparo à mulher, que não é a única responsável pelo abortamento. Esperamos dos homens que sejam mais conscientes de seu papel enquanto pais, no comprometimento com o cuidado dos filhos e com a mulher. Das autoridades, esperamos que trabalhem em projetos de educação sexual de viés mais ético e moral, trazendo valores como respeito ao próximo e discernimento perante a vida. A responsabilidade pelo abortamento é de todos.

Como espíritas, nosso dever é também olhar esse problema sob outro ponto de vista. O que sabemos verdadeiramente sobre a vida? Há dois milênios, um doutor de Israel, ao perguntar a Jesus sobre a necessidade de nascer de novo para alcançar o Reino de Deus, recebeu a seguinte resposta: “Tu és Mestre em Israel, e não sabes isto?”4. E hoje, alguns doutores modernos, representados nas figuras de médicos e cientistas, advogados e sociólogos, mesmo após o advento do Espiritismo, prosseguem duvidando da existência do Espírito. Em verdade duvidam se eles próprios existem.5

Nós, espíritas, não temos dúvidas porque as provas já se deram aos milhares em todas as partes do mundo, inclusive no Brasil. Nós, espíritas, não cremos, mas sabemos que o Espírito é imortal e que ele regressa para a existência terrena em um novo corpo. E quando Allan Kardec, na questão 358 de O Livro dos Espíritos, fez a pergunta aos Espíritos Superiores “constitui crime a provocação do aborto, em qualquer período da gestação?”, eles responderam: “Há crime sempre que transgredis a lei de Deus. Uma mãe, ou quem quer que seja,cometerá crime sempre que tirar a vida a uma criança antes do seu nascimento, por isso que impede uma alma de passar pelas provas a que serviria de instrumento o corpo que se estava formando.”6

Reforçamos aqui que a pergunta é clara e específica quando diz: “Em qualquer período da gestação”. Não importa se na 12ª semana ou em qualquer outro momento, o abortamento constitui um crime perante as Leis Divinas. A única exceção, capaz de justificar a interrupção do processo de retorno à vida corporal do ser, é apresentada na questão 359 de O Livro dos Espíritos, quando a mãe corre grave risco de morrer caso a gestação continue.

Em vista disso, trazemos uma reflexão sobre o papel do Centro e do movimento espírita diante desse quadro social, onde a discussão do aborto é apenas a ponta do iceberg, cujas dimensões estamos longe de contemplar. O aborto é consequência da ignorância humana no que se relaciona à realidade espiritual. É a resultante de uma sociedade materialista, carente de educação espiritual e por consequência, egoísta e sensual. Torna-se necessário um trabalho sério e de profundidade no estudo da Doutrina Espírita. É preciso trabalhar os fundamentos do Espiritismo com adultos, jovens e crianças.

Porém, ainda mais importante é estimular a reflexão sobre a nossa conduta moral nos relacionamentos afetivos a partir desses fundamentos. É relevante a missão dos Centros Espíritas nesse cenário social, esclarecendo quanto à importância da vida, na compreensão de quem somos, de onde viemos, para onde iremos e o porquê de estarmos aqui. Com a finalidade de que homens e mulheres saibam dos objetivos sagrados da vida, das consequências de suas ações na vida presente e nas futuras. Espíritas, não podemos nos eximir do nosso compromisso de esclarecimento espiritual da humanidade.

Dessa forma, relembramos a Missão dos Espíritas para encorajarmo-nos, mesmo quando a Verdade for desprezada e hostilizada pelo mundo:

“Pregareis o desinteresse aos avaros, a abstinência aos dissolutos, a mansidão aos tiranos domésticos, como aos déspotas! Palavras perdidas, eu o sei; mas não importa. Faz-se mister regueis com os vossos suores o terreno onde tendes de semear, porquanto ele não frutificará e não produzirá senão sob os reiterados golpes da enxada e da charrua evangélicas. Ide e pregai!”7

Diretoria Executiva da USE – União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo

Notas:

1) Por definição chama-se o concepto de embrião até a 10ª semana e a partir de então, chama-se de feto até o nascimento. A fim de conferir maior acessibilidade à nota, preferimos manter o texto em termos o menos técnico possível para o correto entendimento.

2) Abortamento: Ato de abortar. Aborto: embrião ou feto retirado após um abortamento

3) Art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil.

4) Evangelho de João 3:10.

5) Caminho Verdade e Vida, cap.111 – Orientadores do Mundo, psicografia de Francisco Cândido Xavier, pelo Espírito Emmanuel.

Extraído de:

http://www.usesp.org.br/Publicacoes/artigo/detalhe/289