Princípios ético-morais na atualidade

Princípios ético-morais na atualidade

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

Os momentos vividos no mundo provocam impactos na sociedade em geral e diversas abordagens têm sido realizadas para se compreender o cenário atual.
As análises com base na ética e na moral são sempre pertinentes. Há muitos estudos acadêmicos que discutem os conceitos e a aplicação da ética e da moral, porém parece-nos oportuna a reflexão fundamentada na concepção espírita e de maneira simples.
Em geral, aceita-se que a ética procura distinguir o bem do mal, o justo do injusto, o certo do errado, o que é permitido e o que é proibido, tendo em vista o conjunto de normas adotadas por uma sociedade; seria mais especulativa. Já a moral se refere às normas ou regras que regem a conduta humana e envolve o dever e prática consciencial. A chamada consciência moral é a capacidade de decidir diante das alternativas possíveis, de distinguir o bem do mal. Portanto, a ética é o fundamento e a moral é a prática. Muitos entendem que ética e moral são inseparáveis.1
Allan Kardec, em suas obras, não empregou a palavra “ética”, mas o conceito e o objeto desta estão implícitos em O livro dos espíritos e O evangelho segundo o espiritismo. No livro inaugural do Espiritismo, o Codificador analisa as “Leis Morais”2, e na Introdução de O evangelho segundo o espiritismo, ele define o ensino moral como o objetivo desta obra.3
A ética cristã está fundamentada nos ensinos do Cristo, sintetizados na “regra de ouro”: "Tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós” (Mateus 7, 12).
Em memoráveis Epístolas, Paulo de Tarso definiu diretrizes de ordem comportamental das quais destacamos alguns versículos4:
“Examinai tudo. Retende o bem" (1 Tessalonicenses 5, 21); Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas convêm; todas as coisas me são lícitas, mas nem todas as coisas edificam" (I Coríntios 10, 23); "Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem" (Romanos 12, 21); "[…] já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim" (Gálatas 2, 19-20).
O fato de Paulo citar o chavão da época referente à cidade de Corinto – “todas as coisas são lícitas” -, aponta para uma situação que o afligia. Os cristãos dos nascentes grupos de Corinto sofriam influências do contexto perverso daquela cidade. A expressão “viver como um coríntio” referia-se a desregramentos comportamentais, considerados “normais” naquela cidade. A tendência de adoção de práticas aberrantes, motivou a elaboração da 1a Epístola aos Coríntios.4
Paulo desenvolveu o raciocínio de que alguns princípios defendidos naquela sociedade precisavam ser observados através de diretrizes ligadas à conduta cristã, não se restringindo às tradições e normas vigentes.
Respeitadas as diferenças, parece-nos que a colocação de Paulo é adequada aos nossos dias, em que num ambiente de liberdade de pensamento e de legislações liberais, proliferam vários tipos de guerras, dentro dos países ou entre eles, ocorrem questionamentos de valores e facilidades de comunicação, incluindo a indiscriminada disseminação de notícias e análises dúbias ou inverídicas nas redes sociais.
No conjunto – Constituição do país, Leis e normas -, define-se o que é legal, o que é “lícito” no dizer de Paulo de Tarso.
Como ficariam as ideias de conveniência e de edificação que Paulo emprega na citada Epístola para a análise das licitudes? E isso sem se entrar na questão da proliferação de hábitos e ações ilícitos…
A mensagem essencial da Boa Nova fortalece princípios e o cultivo de virtudes. Sobre isso, o Espiritismo traz à tona a ideia do livre-arbítrio dentro dos conceitos que emanam do conhecimento de vida imortal e de reencarnação, e, dos compromissos do ser espiritual consigo mesmo e com a sociedade.
Em O livro dos espíritos há várias abordagens referentes à moral, como as questões abaixo2:
“- A moral é a regra de bem proceder, isto é, de distinguir o bem do mal. Funda-se na observância da lei de Deus. O homem procede bem quando tudo faz pelo bem de todos, porque então cumpre a lei de Deus.”
“- O bem é tudo o que é conforme à lei de Deus; o mal, tudo o que lhe é contrário. Assim, fazer o bem é proceder de acordo com a lei de Deus. Fazer o mal é infringí-la.”
Em as Leis Morais de O livro dos espíritos, Allan Kardec destaca que a lei divina ou natural, a Lei de Deus, é “a única e verdadeira a conduzir o homem à felicidade e que lhe indica o que ele deve ou não fazer” e que essa “lei está escrita na consciência do homem.”2
A ética espírita baseia-se nas máximas morais do Cristo e na busca o conhecimento da verdade. Está definida no livro inicial de Kardec ao examinar a Lei de Deus no tocante ao bem e o mal e ao apresentá-la subdividida em várias leis. Para Kardec, a justiça, amor e caridade é a lei “mais importante, por ser a que faculta ao homem adiantar-se mais na vida espiritual, visto que resume todas as outras" […] “lei que se funda na certeza do futuro."2
Os valores espirituais e afetivos não podem ser subjugados por valores cognitivos e imediatistas. Emmanuel faz um valioso apontamento sintético: “O sentimento e a sabedoria são as duas asas com que a alma se elevará para a perfeição infinita.”5
Essas colocações espirituais e espíritas oferecem parâmetros para se definir o que é lícito e conveniente, o que atende aos objetivos do bem, ou seja, o que é moralmente compatível com os ensinos do Cristo e os princípios do Espiritismo.
A enfermidade ética e moral tem raízes desde a base da sociedade. E repercutem em várias instâncias das nações.
Haja vista as vigentes manifestações guerreiras e torna-se oportuno recordarmos de comentário de Emmanuel: “[…] A guerra é inevitável nessa civilização que depende exclusivamente do militarismo. Os grandes exércitos são a sua grande ruína,” e aponta: “[…] o afinamento da mentalidade do mundo terrestre no ideal de perfeição e de amor de Jesus Cristo não chegou a se verificar em tempo algum. Apelamos para a cristianização de todos os espíritos e é dentro desse sentido que se guarda o mais alto objetivo de todas as nossas mensagens”.6
As inquietações e até turbulências que advém das dificuldades que a população passa nos momentos de crises mais intensas devem ser encaradas com respeito e serenidade.
Sobre esse cenário, Emmanuel pondera: “[…] no fracasso de todas as tentativas pacíficas, o cristão sincero, na sua feição individual, nunca deverá cair ao nível do agressor, sabendo estabelecer, em todas as circunstâncias, a diferença entre os seus valores morais e os instintos animalizados da violência física.”5
Para concluir, lembramos que as obras de Kardec, em vários trechos comentam a causa principal dos distúrbios ético-morais, que pode ser resumida com a frase: “O egoísmo, chaga da Humanidade, tem que desaparecer da Terra, a cujo progresso moral obsta.”2
Evocamos mais uma vez o apóstolo Paulo com seus marcantes registros. Anota a situação dele e, pode-se dizer de muitos, que adotam princípios ético-morais no contexto de nosso mundo e deixa claro que a consciência tranquila e o dever cumprido são as melhores recompensas espirituais:
“Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé.” (2 Timóteo 4, 7)

Referências:
1) Souza, Sonia Maria Ribeiro. Um outro olhar: filosofia. 1.ed. Cap. 10. São Paulo: FTD. 1995.
2) Kardec, Allan. Trad. Ribeiro, Guillon. O livro dos espíritos. 70.ed. 3a Parte, cap. II a XI; questões 629 e 630; Conclusão IV. Rio de Janeiro: FEB. 1989.
3) Kardec, Allan. Trad. Ribeiro, Guillon. O evangelho segundo o espiritismo. 131.e. Cap. XI, item 11. Brasília: FEB. 2013.
4) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Epístolas de Paulo à luz do espiritismo. 1.ed. Cap. 2 e 5. Matão: O Clarim. 2016.
5) Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. O consolador. 29.ed. Questões 68, 127, 148, 170, 204, 345, 365. Brasília: FEB. 2013.
6) Xavier, Francisco Cândido. Espíritos diversos. Ação, vida e luz. P. 25-26. São Paulo: CEU. 1991.
DE:
Revista Internacional de Espiritismo. Ano XCIX. N. 1. Fevereiro de 2024. P. 44-45.