Os “imortais” na senda literária

Os “imortais” na senda literária

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Pela passagem dos 30 anos da instalação da Academia Araçatubense de Letras, a sua revista Plural, na edição de novembro de 2022, trouxe matérias alusivas à história e o desenvolvimento dessa Academia que surgiu em função do idealismo de um grupo de intelectuais de Araçatuba (SP).

Na época, convidado como autor de livros profissionais e espíritas, participamos dos preparativos e da fundação da Academia.

Os tempos iniciais foram muito agradáveis pois convivemos com ex-professores nossos, jornalistas, profissionais amigos, colegas da Faculdade de Odontologia da UNESP e antigos vultos da cidade. Destacamos os esforços de Célio Pinheiro e Odette Costa Bodstein.

Em novembro de 1992 aconteceu a Assembleia de instalação da Academia e em março de 1993 houve a posse dos acadêmicos, tradicionalmente chamados “imortais”, paramentados com uma beca especial, em sessão solene no Araçatuba Clube. Na condição de acadêmico-fundador, tivemos o privilégio de designar como patrono de nossa “Cadeira”, Almir Rodrigues Bento (1918-1945), vulto jovem da cidade, jornalista, poeta e espírita militante. Atuamos por alguns anos na Academia e mesmo residindo em São Paulo e Brasília, sempre que possível comparecíamos às reuniões da Academia e contribuíamos com assiduidade com artigos na revista oficial Plural, além de outras matérias costumeiramente publicadas pelos jornais da cidade.

Depois ponderamos que seria mais adequado solicitar nosso afastamento e abrir uma vaga para um residente em Araçatuba. Permanecemos na categoria de “acadêmico agregado”.

O acadêmico Hélio Consolaro é o editor da revista Plural. O lema da Academia “VIIS PULCHRITUDINIS” (Pelos caminhos da beleza) emerge nessa edição histórica do órgão da Academia, com matérias sobre o dinamismo da “Casa do Escritor” de Araçatuba, as marcantes ações culturais com nuances “arejadas e inclusivas”, como destaca o editor.

Em 2021, estivemos pessoalmente em visita ao presidente da Academia Araçatubense de Letras para a oferta de nosso livro Pelos caminhos da vida. Memórias e reflexões (Ed.Cocriação). Aliás, essa obra contém registros sobre a origem da Academia no capítulo “Imortal de Araçatuba”.

Sempre tivemos a certeza de sermos espírito imortal. E há 30 anos atrás oficialmente fomos considerados “imortal” em Araçatuba…

Por quê Almir Rodrigues Bento?

Pela dupla condição: Almir Rodrigues Bento ficou imortalizado pelas suas obras de poemas e era convicto da imortalidade do espírito.

Esse contexto sobre o vulto nos motivou a designação da cadeira que inaugurávamos na Academia Araçatubense de Letras. Em Araçatuba, Almir participava das atividades da Aliança Espírita “Varas da Videira”. Funcionário de cartório, estudante da então Faculdade de Comércio D. Pedro II, foi dinamizador da Federação dos Estudantes de Araçatuba. Caracterizava-se pelo seu entusiasmo, pois era um jovem muito ativo e patriota. Viveu um período na capital paulista, onde atuou como jornalista e veio a se relacionar com colegas e literatos. Por necessidade de saúde, mudou-se para São José dos Campos, onde faleceu tuberculoso. Seu livro inicial, o ensaio literário O Estranho Idioma, foi composto e impresso em Araçatuba, na Empresa Tipográfica “A Comarca”, em 1939. Dedica-o a Joaquim Dibo, Fausto Perri, Basílio, Armando Nocera e Álvaro Siqueira. Esta obra reflete o dilema da época em que foi escrita, entre a revolução constitucionalista e os preparativos para a 2a Grande Guerra. É uma mensagem de fé no País, de forte patriotismo.

A obra Sol, editada em São Paulo no ano de 1942, teve apresentação do conhecido poeta paulista Menotti Del Picchia que foi um dos promotores da Semana de Arte Moderna (São Paulo, 1922) e membro da Academia Brasileira de Letras. Este, destaca que “as estrofes guardam toda essa vibração interior, incitam à crença, conclamam o homem para virtudes de que anda tão esquecido”. A crítica literária dos jornais paulistanos foi elogiosa ao poeta Almir.

Também editado na capital paulista, Canto do Homem Novo veio a lume em 1944, transparecendo o pensamento universalista do autor. O lírico, o revolucionário e o social formam um todo de várias faces. Para Almir Rodrigues Bento, o homem novo nasceu com “sentimentos há muito brotados e espalhados em todas as nações – […] e está tomando parte nas lutas armadas, nas transformações artísticas, nas renovações sociais – […] o Homem Novo não é o indivíduo; é um tipo padrão, ou melhor: um ideal dentro do homem”. A crença na imortalidade viceja em todas suas produções.

No poema “Metempsicose” da obra Sol, deixa clara sua crença religiosa. Eis um trecho: “Tenho saudades, minha amiga,/ dos recantos por onde andei/ em eras remotíssimas, quando ainda vivia no sangue/ de caciques valentes e de negros/ caçadores do país das palmeiras e dos areiais/ É uma saudade milenar, retrospectiva;…” Almir se apresenta como cultor do amor e da natureza, fazendo emergir em prosa e verso uma visão abrangente e altiva da vida. Embora distanciado no tempo,

Almir nunca nos pareceu estranho pois fomos contemporâneos a vários de seus parentes. Nossa genitora Bebé conheceu-o, inclusive porque ele foi aluno e um líder em escola privada de nossos tios Joaquim Dibo e Fausto Perri, que foram homenageados por Almir em seu primeiro livro. Nos tempos de Araçatuba chegamos a manter amizade com suas irmãs, antes de se mudarem de Araçatuba em meados dos anos 1970 e detectamos suas marcas no movimento espírita, quando elaboramos uma pesquisa histórica sobre o Espiritismo em Araçatuba.

Almir foi homenageado pela municipalidade araçatubense, e seu nome designa uma rua no Jardim América, travessa da rua Bolívia. Essas razões fizeram que, como membro fundador da Academia Araçatubense de Letras, propuséssemos Almir Rodrigues Bento como patrono da cadeira no 4.

Fontes:

- Academia Araçatubense de Letras. Plural. Ano 30. N. 15. Novembro, 2022. 49p.

- Autores diversos; Gobi, Ismael (Org.). Obra de vultos. V.1. Cap.2. Araçatuba: USE Regional de Araçatuba. 1999.

- Boletim digital Notícias do movimento espírita: http://www.noticiasespiritas.com.br/2021/MARCO/05-03-2021.htm).

- Carvalho, Antonio Cesar Perri. Pelos caminhos da vida. Memórias e reflexões. Cap. 2.22. Araçatuba: Cocriação. 2021.