Laços espirituais entre Chico Xavier e Emmanuel

Laços espirituais entre Chico Xavier e Emmanuel

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Há inúmeros depoimentos de Chico Xavier sobre suas relações espirituais com Emmanuel, desde a histórica visão nos idos de 1931 quando seu orientador se apresentou e ofereceu a orientação da “disciplina, disciplina, disciplina”. Sempre interessado pelas obras desse Espírito e relatos do médium sobre o mesmo, procuramos reunir preciosos registros.

À vista disso, planejamos um novo livro1 evitando mera repetição de casos já muito divulgados. Selecionamos alguns em que fomos testemunhas nos contatos com Chico e com seus amigos fieis da chamada “primeira hora”, que chegamos a conhecê-los. O desenvolvimento do conteúdo foi realizado a partir dos nossos estudos, observações e vivência em contactos com a vida e obra de Chico Xavier. Nos episódios que selecionamos, bem como a análise das obras de Emmanuel, notadamente dos chamados romances históricos, não tivemos o objetivo de estimular curiosidades, mas de relacionar com uma visão abrangente a trajetória espiritual do orientador espiritual de Chico, para melhor entendermos e valorizarmos o papel do notável exegeta do Novo Testamento à luz do Espiritismo.

Os romances históricos de autoria de Emmanuel oferecem relatos sobre vários vultos dos albores do Cristianismo, incluindo algumas vivências do autor espiritual e do médium. Dessas obras deve-se extrair a essência que pode ser relacionada com os esforços de aprendizagem e evolução espiritual. Daí, ser cabível a afirmação que gravamos de Arnaldo Rocha, o viúvo de Meimei: “Cada história tem seu enredo; mas as mortes de Públio Lentulus Sura, Públio Lentulus Cornelius, Nestório e Basílio nos revelam profundos ensinamentos sobre a lei de causa e efeito e a libertação pelo Evangelho. Afinal, todas elas tratam da mesma alma em evolução, ou seja, esse Espírito benéfico e amoroso que todos admiramos com nossos mais sinceros sentimentos, Emmanuel”.1

Embora Emmanuel não seja personagem do enredo de sua “obra prima” Paulo e Estêvão, destacamos contatos havidos entre o senador Lentulus e Paulo no cenário corpóreo e no Mundo Espiritual. Emmanuel é grato e profundo admirador da vida e epístolas do notável apóstolo. Realçamos comentários da época da edição do épico romance Paulo e Estêvão; foram publicados três artigos na revista Reformador, assinalando o lançamento da obra. Destacamos neste artigo que na edição de julho de 1942, o articulista Alexandre Dias assinala: “as cenas e os cenários bem traçados, como a perfeita caracterização dos personagens, prendem a atenção do leitor…”1 Conhecida liderança espírita daquela década Roberto Pedro Michelena (depois general), de Porto Alegre, declarou: “Mas o luminoso espírito de Emmanuel monopoliza-lhe, por alguns anos, a mediunidade ímpar. Dá-lhe o fabuloso romance Há dois mil anos que é sua própria autobiografia, de quando ele, Emmanuel, fora, ao tempo do Cristo, proconsul romano na Palestina. O enredo, a beleza e os ensinamentos cristãos desse livro, asseguram-lhe lugar culminante na literatura brasileira. É um retificador de almas! Segue-se, entre muitos outros, o épico romance Paulo e Estêvão”.1

O romance Ave, Cristo! foi concluído por Emmanuel no dia 18 de abril de 1953 e na passagem de novembro para dezembro já estava editado pela FEB. Rapidamente, Arnaldo Rocha recebeu o primeiro exemplar da nova obra autografada pelo médium. Ele é um dos personagens desse enredo do século III, bem como outros contemporâneos de Chico, e, tem muita relação com episódios subsequentes registrados no inspirado livro Esquina de pedra, de Wallace Leal Valentim Rodrigues (Casa Editora O Clarim).

Dos anos 1950 há um curioso relato de Ramiro Gama, amigo do médium dos tempos de Pedro Leopoldo, a respeito de um conhecido confrade de São Paulo que certa feita chegou ao Centro Espírita Luiz Gonzaga. Abraça o médium e diz: “- Vim de São Paulo especialmente para lhe dar um beijo. E dando-lhe o beijo na face, conclui: beijando-o, tenho a impressão de que beijei seu querido Guia Emmanuel. E o Chico com toda candidez e humildade respondeu-lhe: – Não, meu caro Irmão, você não beijou Emmanuel mas sim o seu burrinho, que sou eu”.1

No transcorrer do primeiro programa “Pinga Fogo” Chico fez um depoimento que deixa bem clara sua relação com o Espírito: “Emmanuel tem sido para mim um verdadeiro pai na Vida Espiritual, pelo carinho com que me tolera as falhas e pela bondade com que repete as lições que devo aprender. Em todos esses anos de convívio estreito, quase diário, ele me traçou programas e horários de estudo, nos quais a princípio até inclui datilografia e gramática, procurando desenvolver os meus singelos conhecimentos de curso primário, em Pedro Leopoldo, o único que fiz até agora, no terreno da instrução oficial. […] O tempo de convivência com o Espírito de Emmanuel, nosso guia, parece que criou entre ele e eu um processo de conhecimento e palavra por osmose. Vão me perdoar… eu não sei definir o problema. Sei que ele está presente, mas ele não permite que faça muitas observações mediúnicas, para que eu me mantenha estritamente dentro do programa e não com qualquer distração para observações marginais.”1

Particularmente, ouvimos comentários muito significativos durante visitas que fizemos ao médium em Uberaba. Em janeiro de 1977, cerca de dois meses após sofrer um enfarte, ele nos relatou a advertência do pai espiritual enérgico. Chico mostrou-nos a quantidade de medicamentos que estava utilizando. Sempre fazendo brincadeiras dizia, sorrindo, que estava escravo deles… Porém, ficando sério, contou ao grupo de visitantes que, contrapondo-se a momentos passageiros de desânimo, Emmanuel afirmou-lhe incisivo: "Sai da cama ou vai para a cova…" Chico tratou de se adequar rapidamente à nova situação e retornar às suas atividades e sobreviveu mais 25 anos dedicados ao trabalho mediúnico.

Na análise e reflexão sobre a trajetória espiritual de Emmanuel e o valoroso conteúdo de suas obras pela psicografia de Francisco Cândido Xavier, dispomos de subsídios de inestimável valor para a educação do Ser fundamentada na Boa Nova com a ótica espírita!

Referência:

1) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Emmanuel. Trajetória espiritual e ações com Chico Xavier. Matão: O Clarim. 2020. 208p.

De:

Revista internacional de espiritismo. Ano XCV. N.8. Setembro de 2020. P. 384-385.