Cultos religiosos em Cuba

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Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

            No início dos anos 1990, em programas da Universidade Estadual Paulista-UNESP, estivemos representando-a em algumas viagens a Cuba. Numa das oportunidades integramos comitiva oficial de dirigentes universitários com objetivo de conhecer seus programas de educação e saúde, e assinar convênios institucionais, inclusive com acesso a eventos com a presença do presidente e vários ministros.

            Numa dessas viagens oficiais obtivemos autorização, acompanhado de um vice-ministro, para audiência na sede do governo – o Palácio da Revolução -, com o já idoso ministro dr. José Felipe Carneado, chefe do Departamento de Assuntos Religiosos do Comitê Central do Partido Comunista Cubano, que era apelidado pela equipe governamental como "nosso cardeal".

            Ao retornarmos, publicamos um registro sintético da inusitada ocorrência em artigo na Revista Internacional de Espiritismo.(**) O ministro nos esclareceu como aquele governo lidava com os cultos religiosos desde os primeiros tempos da revolução até aqueles dias. Citou episódios históricos e justificou algumas restrições envolvendo várias religiões; entrou em detalhes sobre os cultos afros, muito populares em função da escravidão vigente em séculos passados; e a relação amistosa com a maçonaria. Naquela oportunidade – fevereiro de 1992 – informou-nos que o Congresso do Partido Comunista Cubano (que rege o governo daquele país) de 1991 já introduzia novidades iniciais, reconhecendo alguns religiosos.

            Ao final da entrevista cordial, o ministro nos ofereceu livro sobre o tema e entregamos a ele um exemplar de nosso livro – então recente – Entre a matéria e o espírito (Casa Editora O Clarim). Para surpresa nossa ele nos solicitou uma dedicatória. Em seguida, acompanhado de um assessor governamental, fomos levado a conhecer médium da popular "santeria" – equivalente ao candomblé de nosso país -, muito disseminado naquele país e sentimos que haveria um beneplácito oficial.  

            Na década seguinte, tivemos contatos com companheiros do Conselho Espírita Internacional que já labutavam na área espírita em ações relacionadas com Cuba e que nos informaram sobre o início de um processo de liberação dos cultos religiosos e inclusive do Espiritismo. Destacamos Edwin Bravo, da Guatemala, e coordenador do Conselho Espírita Internacional para a América Central e Caribe, principal responsável pela abertura ao Espiritismo junto a autoridades cubanas, contando com o apoio de espíritas radicados naquele país, como a família Agramonte, e de Manuel de la Cruz, de origem cubana, mas radicado em Miami (EUA).

            No primeiro semestre de 2004 já houve um evento espírita em Havana e liberado pelo governo cubano. Outros eventos ali foram realizados com apoio do CEI-América Central e Caribe. Por solicitação e estímulo dos já citados companheiros e com total apoio de Nestor João Masotti – então secretário geral do CEI e presidente da FEB – foi doado a Cuba um "container" repleto de livros espíritas em espanhol.

            Em 2011 foi reinaugurado o busto de Allan Kardec em praça na cidade de Havana. Havia sido erigido em 1957 e retirado em seguida a 1960.

            Quando o Conselho Espírita Internacional aprovou que      o 7o Congresso Espírita Mundial, seria realizado em Havana, por delegação do então secretário geral do CEI o representamos em vários contatos diretos naquele país.  Em 2011 atuamos no 6o Congresso Espírita Centroamericano e do Caribe e o 27o Congresso Espírita Cubano, realizado na cidade de Bayamo, com excelentes diálogos com autoridades do país e lideranças espíritas do país, e conhecemos centros tradicionais daquela região oriental. Interessante é que naqueles dias ocorria o Congresso do Partido Comunista Cubano e o presidente do país, pela primeira vez, citou os espíritas no seu discurso. No mesmo ano retornamos com tarefas específicas para preparação do Congresso Mundial juntamente com a Comissão de Apoio do CEI para o 7o Congresso Espírita Mundial. Representando o CEI estivemos em reunião com vice-ministros, incluindo os dirigentes do Departamento de Assuntos Religiosos, dentro do Palácio da Revolução, a sede do governo de Cuba.        

            Finalmente, em março de 2013 ocorreu o 7o Congresso Espírita Mundial, que foi um sucesso de participação, e com o apoio do governo, com a presença significativa de cubanos de várias partes do país. A imprensa espírita deu destaque ao evento. Houve também um pré-Congresso na Região Leste de Cuba, com palestras e visitas a instituições espíritas de Manzanillo, Bayamo e Sierra Maestra, região onde se concentra a maioria dos espíritas do país. Para o Congresso foi ofertado um "container" de livros editados em espanhol pelo CEI e pelo IDE em parceria com a Editora venezuelana Mensaje Fraternal, para distribuição aos mais de 500 grupos espíritas em funcionamento naquele país. O CEI e a FEB doaram uma edição especial em parceria, em espanhol, de O evangelho segundo o espiritismo, entregue a todos os congressistas.

            Na primeira metade do Século XX havia um bem desenvolvido movimento espírita em Cuba, inclusive com realização de eventos nacionais. Houve um interregno em função da política então vigente sobre cultos religiosos. Desde a inesperada audiência com o ministro cubano até a realização do marcante Congresso Mundial, onde comparecemos como presidente da FEB, sentimos que no espaço de 21 anos, ocorreram muitas transformações no tocante à liberação dos cultos religiosos e a busca pelo Espiritismo se manteve e se expandiu.

 

(*) Ex-presidente da FEB e ex-membro da Comissão Executiva do CEI.

(**) Síntese do artigo: Carvalho, Antonio Cesar Perri. Cultos religiosos em Cuba. Revista internacional de espiritismo. Ano LXVII. No. 3. Abril de 1992. P.81-82.