A Deus o que é de Deus

Antonio Cesar Perri de Carvalho

A palavra de Jesus “Daí a Cesar o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus” (Marcos, 12,17) passou a ser considerada como fundamento do respeito dos cristãos ao Estado, mas também da separação entre os domínios político e religioso.

É sabido que algumas autoridades do império romano utilizaram essa frase do Cristo até na tentativa para amenização das iras daqueles que recomendavam perseguições aos primitivos cristãos.

Por outro lado, os cristãos sentiam-se à vontade porque se consideravam súditos respeitosos. Paulo fez colocações nessa linha em suas Epístolas.

Interessante o comentário de Emmanuel: “Se pretendes viver retamente, não dês a César o vinagre da crítica acerba. Ajuda-o com o teu trabalho eficiente, no sadio desejo de acertar, convicto de que ele e nós somos filhos do mesmo Deus.”1

Nos albores do cristianismo, no âmbito da administração central do império romano não ocorriam apenas perseguições, o que levou Emmanuel, a partir de versículo de epístola de Paulo: “Todos os santos vos saúdam, mas principalmente os que são da casa de César” (Filipenses, 4, 22), fazer o seguinte comentário: “Muito comum ouvirmos observações descabidas de determinados irmãos na crença, relativamente aos companheiros chamados a tarefas mais difíceis, entre as possibilidades do dinheiro ou do poder. […] Paulo de Tarso, humilhado e perseguido em Roma, teve ocasião de conhecer numerosas almas nessas condições, e o que é mais de admirar – conviveu com diversos discípulos de semelhante posição, relacionados com a habitação palaciana de César. Deles recebeu atenções e favores, assistência e carinho.”2,3

De um lado o Estado romano e, de outro, havia também momentos complicados nas relações com o Sinédrio e seus representantes.

Saulo de Tarso optou em deixar a tradicional e pioneira ecclesia de Jerusalém, ao verificar que surgiam propostas judaizantes por parte de alguns discípulos do Cristo, iniciando sua grande tarefa de divulgador do Evangelho.

Na sua missionária trajetória, o apóstolo Paulo sempre lutou pela independência dos grupos cristãos com relação a autoridades políticas e do judaísmo. Ao comentar a vida e obra de Paulo, o filósofo espírita Herculano Pires destaca a posição clara e marcante do Apóstolo:

"Ele libertava a religião da política e do negócio. Para ele, a religião tinha que ser vivida em si mesma e vivida com toda a independência moral".  A propósito de trecho de Atos dos Apóstolos sobre “muitos milagres e prodígios entre o povo pelas mãos dos apóstolos” o autor aponta que ali se encontra "uma das mais belas confirmações evangélicas da realidade e da verdade do Espiritismo e das suas práticas como continuação do cristianismo em espírito e verdade aqui na terra."4

A mescla de benesses estatais para com o cristianismo se firmou no século IV com o imperador Constantino.

Em nossos tempos, é oportuna a recordação desses fatos históricos para inspirarem a preservação da independência administrativa e financeira das instituições espíritas e a manutenção das condições doutrinárias de fidelidade a Jesus e a Kardec.

Esses objetivos sempre balizaram as ações de Chico Xavier no transcorrer de sua longa existência. Entre muitos episódios nobilitantes, destacamos a opção do médium missionário em deixar uma grande instituição da qual foi um dos fundadores, e dar início a um novo posto de trabalho e de referência, bem simples, o Grupo Espírita da Prece, de Uberaba.5

Referências:  

  1. Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Pão Nosso. 27.ed. Cap. 102. FEB. 2006.
  2. Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Caminho, verdade e vida. 16.ed. Cap. 75. Brasília: FEB. 2012.
  3. Carvalho, Antonio Cesar Perri. Epístolas de Paulo à luz do espiritismo. 1.ed.
  4. Pires, José Herculano. Org. Arribas, Célia. O evangelho de Jesus em espírito e verdade. 1.ed. Cap. 15. São Paulo: Editora Paidéia. 2016.
  5. Carvalho, Antonio Cesar Perri. Centro espírita. Prática espírita e cristã. Cap.1.1, 7.2, 7.3. Matão: O Clarim. 2016.

O espírita na equipe

Numerosos companheiros estarão convencidos de que integrar uma equipe de ação espírita se resume em presenciar os atos rotineiros da instituição a que se vinculam e resgatar singelas obrigações de feição econômica. Mas não é assim. 

O espírita, no conjunto de realizações espíritas, é uma engrenagem inteligente com o dever de funcionar em sintonia com os elevados objetivos da máquina.

Um templo espírita não é simples construção de natureza material. É um ponto do Planeta onde a fé raciocinada estuda as leis universais, mormente no que se reporta à consciência e à justiça, à edificação do destino e à imortalidade do ser. Lar de esclarecimento e consolo, renovação e solidariedade, em cujo equilíbrio cada coração que lhe compõe a estrutura moral se assemelha a peça viva de amor na sustentação da obra em si. 

Não bastará freqüentar-lhe as reuniões. É preciso auscultar as necessidades dessas mesmas reuniões, oferecendo-lhes solução. Respeitar a orientação da casa, mas também contribuir de maneira espontânea, com os dirigentes, na extinção de censuras e rixas, perturbações e dificuldades, tanto quanto possível no nascedouro, a fim de que não se convertam em motivos de 

escândalo. Falar e ouvir construtivamente. 

Efetuar tarefas consideradas pequeninas, como sejam sossegar uma criança, amparar um doente, remover um perigo ou fornecer uma explicação, sem que, para isso, haja necessidade de pedidos diretos. Sobretudo, na organização espírita, o espírita é chamado a colaborar na harmonia comum, silenciando melindres e apagando ressentimentos, estimulando o bem e esquecendo omissões no terreno da exigência individual.

Todos nós, encarnados e desencarnados, comparecemos no templo espírita no intuito de receber o concurso dos Mensageiros do Senhor; no entanto, os Mensageiros do Senhor esperam igualmente por nosso concurso, no amparo a outros, e a nossa cooperação com eles será sempre, acima de tudo, 

trabalhar e servir, auxiliar e compreender.

Emmanuel

(Xavier, Francisco Cândido; Vieira, Waldo. Pelos espíritos Emmanuel e André Luiz. Estude e Viva. Cap.36. FEB)

Espiritismo em Sessão Solene na Assembleia do Espírito Santo

 
A Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo realiza uma Sessão Solene na noite do dia 3 de agosto homenageando o "Dia Estadual da Confraternização Espírita". Conta com o apoio da Federação Espírita do Estado do Espírito Santo e como conferencista convidado Antonio Cesar Perri de Carvalho, ex-presidente da FEB, que abordará o tema "Ética e moral na atualidade". Informações: http://www.feees.org.br/

Livro sobre Espiritismo em Congresso de Sociologia

O livro ESPIRITUALIDADE E ESPIRITISMO: REFLEXÕES PARA ALÉM DA RELIGIOSIDADE será lançado no Congresso Brasileiro de Sociologia, junto com outras obras, na noite de 26/07. O 18º Congresso Brasileiro de Sociologia acontece entre 26 e 29 de julho de 2017 em Brasília. tendo como tema "Que sociologias fazemos? Interfaces com os contextos locais, nacionais e globais". O evento será realizado no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Contará com a presença de organizadores do livro, os professores André Ricardo de Souza e Pedro Simões.

Esse livro trata de questões do Espiritismo no Brasil e da espiritualidade, com abordagens acadêmicas e com farta bibliografia. Entre outros temas, na 1ª. Parte há capítulos sobre: O “Espiritismo Racional e Científico Cristão” de Luiz Mattos dos anos 1910-1920 no Brasil: uma facção “científica” belicosa obscurecida pela hegemonia “religiosa” da Federação Espírita Brasileira (Marcelo Camurça, André Pereira, Jacqueline Amaro); Espiritismo como religião: algumas considerações sobre seu caráter religioso e seu desenvolvimento no Brasil (Flávio Rey de Carvalho, Antonio Cesar Perri de Carvalho); Autoridades espíritas: critérios para tipologias e repartições das lideranças no espiritismo (Célia da Graça Arribas); Ação assistencial espírita (Pedro Simões); As cirurgias na medicina do além (André Ricardo de Souza).

Na Parte 2, há abordagens de temas sobre “A espiritualidade sob olhares que cruzam fronteiras”: Materializando espíritos: religião e ciência no caso de Anna Prado (Emerson Giumbelli, Gustavo Chiesa); Terapias alternativas/complementares e políticas de saúde: um caso de espiritualidade na clínica (Rodrigo Toniol); Purgando a alteridade: muertosi, visão e auto-representação no sonho na religião afro-cubana (Diana Espírito Santo); Reencarnação na América do Norte: histórias e práticas das religiões metafísicas (Courtney Bender).

 

Pedidos:  http://www.faroldastrescolinas.com.br/novo/;  (16) 3703-4411.

Procuremos

“Antes,  vindo  ele  a  Roma,  com  muito  cuidado  me  procurou e me achou.”  Paulo (II Timóteo, 1:17) 

Todas as sentenças evangélicas permanecem assinaladas de beleza e sabedoria ocultas. Indispensável meditar, estabelecer comparações no silêncio e examinar experiências diárias para descobri­-las.

Aquele gesto de Onesíforo, buscando o apóstolo dos gentios, com muito  cuidado, na vida cosmopolita de Roma, representa ensinamento sobremaneira expressivo.

A anotação de Paulo designa ocorrência comum, entretanto, o  aprendiz aplicado ultrapassa a letra para recolher a lição.

Quantos amigos de Jesus e de seus seguidores diretos lhes aguardam a visita, ansiosos e impacientes? Quantos se fixam, imóveis, nas atitudes inferiores, reclamando providências que não fizeram por merecer? Há crentes presunçosos que procuram impor­-se aos Desígnios Divinos, formulando exigências ao Céu, em espinhosas bases de ingratidão e atrevimento. Outros se lamentam, amargurados, quais voluntariosas criancinhas, porque o Mestre não  lhes satisfez os desejos absurdos e inconvenientes.

Raros os aprendizes que refletem nos serviços imensos do Cristo. Estaria Jesus, vagueante e desocupado, na Vida Superior?

Respirariam seus colaboradores diretos, cristalizados na ociosidade beatífica?

Imprescindível é meditar na magnitude do trabalho e da responsabilidade dos obreiros divinos.

Lembremo-­nos de que se Paulo era um prisioneiro aos olhos do mundo, era já, em si mesmo, uma luz viva e brilhante, na condição de apóstolo que o próprio Jesus glorificara. Não era, ante a visão do espírito, um encarcerado e sim um triunfador. Apesar disso, Onesíforo, a fim de vê­-lo, foi constrangido a procurá-­lo com muito cuidado.

Semelhante impositivo ainda é o mesmo nos dias que passam. Para encontrarmos Jesus e aqueles que o servem, faz­-se mister buscá-­los zelosamente.

Emmanuel

(Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Vinha de luz. Cap. 95. FEB)

As difíceis opções de Paulo de Tarso

Antonio Cesar Perri de Carvalho

Na monumental obra Paulo e Estêvão, psicografada por Francisco Cândido Xavier, o autor espiritual Emmanuel aprofunda os registros de Atos e das Epístolas de Paulo detalhando as lutas e humilhações do doutor Saulo de Tarso, autoridade na Lei Moisaica perante seu povo.

Paulo renunciou às suas prerrogativas de doutor da Lei ao iniciar seu processo de transformação no Apóstolo do Cristo e foi submetido pelos seus antigos pares e até por seguidores do Cristo, a constrangimentos e dificuldades acerbas.

As posições de Paulo eram claras e continuadamente registrava em suas Epístolas a sua não aceitação da Lei de Moisés e de se antepor aos chamados legalistas. O ex doutor da Lei se insurgia contra as regras e normas típicas de sua antiga religião tradicional. (1)

Emmanuel explicita o impacto sofrido pelo ex doutor da Lei ao retornar à Casa do Caminho: “[…] torturado pela influência judaizante. Tiago dava a impressão de reingresso, na maioria dos ouvintes, nos regulamentos farisaicos. Suas preleções fugiam ao padrão de liberdade e do amor em Jesus Cristo.” (2)

O acadêmico e pároco anglicano Wright é autor de profundos estudos sobre Paulo e opina que a ação do Apóstolo tem “uma dimensão política, entrelaçada num tecido único da teologia e de sua vida”, porém destaca que a história vivida e narrada por Paulo “é uma história de amor e não de poder.” Wright pondera que, na atualidade, Paulo “pode muito bem vir a ser outra vez uma questão não tanto de compreensão, mas de coragem.” (3)

Na literatura espírita, há registros notáveis de Herculano Pires sobre o apóstolo Paulo e que estão relacionadas com as análises do espírito Emmanuel e do pesquisador Wright. Notadamente relacionados com os dilemas e a transição na complexidade vivida por Paulo, imerso em três contextos, ou seja, a tradição do judaísmo, a cultura grega e o domínio e a legislação romana:

“Paulo, que exemplifica o drama da transição da consciência judaica para a cristã, adverte que Deus não deseja cultos externos, semelhantes aos dedicados às divindades pagãs, mas "um culto racional", em que o sacrifício não será mais de plantas ou animais, mas da animalidade, ou seja, do ego inferior do homem.”  (4)

"Ele libertava a religião da política e do negócio. Para ele, a religião tinha que ser vivida em si mesma e vivida com toda a independência moral".  (5)

A propósito de trecho de Atos sobre “muitos milagres e prodígios entre o povo pelas mãos dos apóstolos”, Herculano Pires aponta que ali se encontra "uma das mais belas confirmações evangélicas da realidade e da verdade do Espiritismo e das suas práticas como continuação do cristianismo em espírito e verdade aqui na terra." (5)

Entendemos que o exemplo de vida e as difíceis opções de Paulo rumo ao “alvo” – “Prossigo para o alvo…” (Filipenses, 3.14), e as Epístolas de Paulo, abstraindo-se algumas discussões do contexto da época, devem merecer o estudo dos espíritas.

Destacamos que na chamada série “Fonte Viva” e demais livros em que Emmanuel comenta versículos do Novo Testamento, de um total de cerca de 1.300 capítulos, mais de um terço dos capítulos se referem a citações de Paulo.

Bibliografia:

  1. Carvalho, Antonio Cesar Perri. Epístolas de Paulo à luz do espiritismo. 1. ed. Matão: O Clarim. 2016.
  2. Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Paulo e Estêvão. Ed.esp. 2a Parte, Cap. 3. Brasília: FEB. 2012.
  3. Wright, Nicolas Thomas. Trad. Soares, Joshua de Bragança. Paulo.  Novas perspectivas. São Paulo: Edições Loyola, 2009.
  4. Pires, José Herculano. O espírito e o tempo. 1ª parte, Cap.II. São Paulo: Ed. Pensamento. 1964.
  5. Pires, José Herculano. Org. Arribas, Célia. O evangelho de Jesus em espírito e verdade. 1.ed. Cap. 15. São Paulo: Editora Paidéia. 2016.

(Ex-presidente da USE-SP e da FEB)

Espiritismo em Congresso de Teologia e Ciências da Religião

    

O tema Espiritismo esteve presente no 30o Congresso Internacional da SOTER – Sociedade de Teologia e Ciências da Religião, realizado em na sede da PUC de Belo Horizonte.

No dia 11 de julho, Flávio Rey de Carvalho apresentou uma comunicação sobre o tema “Atualidade do Espiritismo como religião", com base no capítulo de sua autoria no livro "Espiritualismo e Espiritismo. Reflexões para além da espiritualidade" (Editora Porto de Ideias).

No dia 12 de julho, Flávio Rey de Carvalho (PUC-SP) integrou a mesa sobre o tema "O diálogo interreligioso sobre o Novo Testamento", juntamente com Irmã Aila Pinheiro de Andrade (Ce) e Júlio Adriano Corradi (MG), coordenada por André Ricardo de Souza (UFSCar, SP).

Flávio Rey de Carvalho, autor de artigos na RIE, de capítulos de livros espíritas e de livro acadêmico; atuou na fundação do antigo NEPE da FEB e do GEECX; é doutorando em Ciências da Religião da PUC-SP.