A pandemia e suas profundas repercussões

A pandemia e suas profundas repercussões

Antonio Cesar Perri de Carvalho (*)

A pandemia mundial do COVID-19 tem produzido conseqüências inimagináveis.

Muitos alegam que no Brasil há outras epidemias, endemias e problemas sociais que também levam à morte. Outros lembram de outras epidemias que o país venceu. Realmente, a histórica “gripe espanhola” de um século atrás vitimou até o presidente da República Rodrigues Alves e o valoroso líder espírita Eurípedes Barsanulfo.

Agora estamos frente a uma situação completamente diversa pelas características do novo tipo de coronavírus. O mundo entrou num estado que varia de intensas preocupações até ao pânico desde que foi identificado o surto de coronavírus em Província da China. Em poucos meses o COVID-19 tem infectado e até feito vítimas letais em praticamente todos os países, e, chama atenção que compromete os países mais desenvolvidos do planeta. Silenciosamente o vírus rompeu todas as “redes de segurança” e chegou na intimidade de poderosos governantes.

Sem entrar em comentários sobre os meios de transmissão, a letalidade do Covid-19, comparações com outras epidemias e até ilações espíritas de causa e efeito, há algo que deve ser refletido.

Apenas daqui uns meses é que teremos ideia das reais conseqüências econômicas e sociais no mundo e em nosso país.

Há necessidade de uma reflexão bem ampla sobre a situação e tendências da Humanidade, e, na base, sobre valores. O profundo impacto virótico deve ser analisado também no tocante da questão da indiferença humana com questões de interesse geral que se refletem em consumismo, formas de ganância, desvalorização da família e de contatos sociais.

Agora, com multidões em isolamento social ou em rígidas quarentenas em cidades, regiões e países, grandes navios sem poderem desembarcar seus passageiros, estamos frente a um cenário que ninguém poderia imaginar.

A pandemia mundial está afetando todo o planeta a partir do poder de um microscópico vírus.

As autoridades de saúde chegaram até ao detalhe para se evitar sobrecarregarem os avós com a presença dos netos eventualmente dispensados das escolas, considerando que os idosos são integrantes do grupo de risco. Isso leva ao repensar da relação dos pais com seus filhos em função de compromissos do próprio lar e os profissionais.

O mundo espiritual sempre deixou claro que os encarnados devem zelar pelo corpo físico e valorizar a vida.

E aí surge a indagação: seriam momentos para se rever valores? Ou seja: valores relacionados com os ambientes familiar e social, independentemente de aparências e de máscaras sócio-econômicas? Naturalmente há impactos sobre as instituições e o movimento espírita.

Em virtude da pandemia do coronavírus, as Entidades Federativas adiaram a realização de Congressos Espíritas e os centros espíritas em geral suspenderam atividades.

Haverá necessidade de se rever prioridades em todos os âmbitos de ação. Inclusive, frente a um novo cenário econômico e social, sobre o qual não podemos fazer previsão.

A adoção de uma mensagem de consolo e de esperança espiritual é imperiosa. Quais serão as formas e condições de atendimento das necessidades sociais das pessoas beneficiadas por instituições espíritas?

Várias instituições estão fazendo transmissões ao vivo e reuniões virtuais. O período de quarentena poderá ensejar diversificação e atualização para as práticas espíritas, como a valorização e ampliação das formas de difusão utilizando redes sociais e vídeo conferências.

Com relação aos Congressos, que estavam previstos no território brasileiro em quantidade aparentemente exagerada, poderia caber um estudo e reflexão sobre os mesmos. Alguns aspectos poderiam ser considerados: a praticidade dos mesmos, abstração de eventuais interesses comerciais ou de subsistência de instituições, mais ênfase à seleção de expositores que abordam temáticas doutrinárias, valorização de expositores das várias regiões e se evitar a ênfase na centralização de convidados que parecem ser escolhidos em função de atraírem público. Claramente nota-se a repetição de uns pouquíssimos nomes nos vários Congressos. E o movimento espírita brasileiro é imenso e conta com muitos valores. Talvez alguns Congressos poderiam ser substituídos por seminários regionais e com temas de apoio direto aos centros e ao movimento espírita e também por seminários e palestras a distância, com acesso público e gratuito.

As conseqüências do microscópico Covid-19 na “empoderada” Humanidade de nossos dias, de repente, poderão conduzir a algumas reflexões humanitárias e até de natureza espiritual?

A propósito do contexto que a Civilização está vivendo, é muito oportuno o estudo reflexivo sobre capítulos do livro A Gênese, em que Allan Kardec trata nos capítulos XVI e XVII de assuntos que, claramente, estão relacionados com nossa época. Entre outros comentários: “[…] a época atual é a da transição: os elementos das duas gerações se embaralham. Colocados no ponto intermediário, presenciamos a partida de uma e a chegada da outra, a cada qual se distingue no mundo pelas características que lhe são próprias.” O Codificador alerta que: “[…] a fraternidade será a pedra angular da nova ordem social, mas não há fraternidade real, sólida e efetiva sem estar apoiada sobre uma base inabalável. Essa base é a fé; não a fé em tais ou quais dogmas particulares que mudam com o tempo e os povos e que se apedrejam mutuamente…”1

Fonte:

1) Kardec, Allan. A gênese. Os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Cap. XVI e XVII. São Paulo: FEAL. 2018.

(*) Foi presidente da FEB e da USE-SP; membro da Comissão Executiva do CEI.

Entraído de:

Revista internacional de espiritismo. Ano XCV. N.4. Maio de 2020. p.164-165.