A fraternidade no diálogo espiritual

A fraternidade no diálogo espiritual

Antonio Cesar Perri de Carvalho

O Grupo Espírita Casa do Caminho, de São Paulo, tem promovido estudos continuados em que o seminário “papel dos esclarecedores nos grupos mediúnicos” tem sido repetido e aprofundado.

Trata-se de tema que deve merecer muita atenção nesses grupos dos centros espíritas.

O tema nos remete, de início, a Chico Xavier que atuou no Centro Espírita Luiz Gonzaga desde a fundação em 1927 até sua mudança para Uberaba, no início de 1959. Nesse local atendeu semanalmente muitos milhares de pessoas que o procuravam sedentos de consolo e esclarecimento espiritual. A partir desses diálogos com Chico Xavier com as pessoas, sempre solícito e fraternal, iniciava-se um atendimento que, sem dúvida, envolvia o tratamento espiritual dos encarnados e dos desencarnados que eram por eles atraídos. Alguns desses espíritos eram encaminhados para postos de acolhimento do Mundo Espiritual, outros eram envolvidos na esfera de atendimento do próprio Centro em função de suas reuniões. Nas reuniões mediúnicas Chico Xavier atuava não apenas como médium de espíritos esclarecidos e orientadores, mas também para manifestação de espíritos enfermiços. Ademais, um grupo de colaboradores do Centro Espírita Luiz Gonzaga, incluindo Chico Xavier, constituíu o Grupo Meimei, voltado ao atendimento de espíritos enfermiços.

O inesquecível médium mineiro transmitiu a Arnaldo Rocha, que era o coordenador desse Grupo, algumas recomendações: “[…] porque se deve dialogar com os Espíritos sem qualquer ideia de doutrinação. […] transmitiu-me as orientações iniciais de Emmanuel: nunca discutir com a entidade comunicante e nem falar que ela já ‘morreu’…”1

De início, a compreensão e a tradição religiosa do espírito comunicante deve ser respeitada. Entre muitos exemplos há a série de cartas familiares de espírito que desencarnou convicto das tradições do judaísmo.2,3

Há muitas obras que tratam da prática do diálogo com os espíritos enfermiços. Iremos nos restringir apenas a alguns, resultantes da mediunidade de Chico Xavier. Entre estes, Instruções psicofônicas, que é resultado das transcrições das gravações do já citado Grupo Meimei, coordenado por Arnaldo Rocha. Deste livro e da entrevista com Arnaldo destacamos a mensagem de Emmanuel: “Sem o carinho e a receptividade do coração, sofreremos o império do desespero. Sem o devotamento e a decisão do braço, padeceremos a inércia. Contudo, para que o trio funcione com eficiência, são necessários três requisitos na máquina de ação em que se expressam: Confiança. Boa-vontade. Harmonia.”4

Em outra obra que relaciona a prática mediúnica com a moral ensinada por Jesus, Emmanuel orienta: “Cultivar o tato psicológico, evitando atitudes ou palavras violentas, mas fugindo da doçura sistemática que anestesia a mente sem renová-la.”5

A essa altura cabem dois comentários sintéticos do espírito Emmanuel sobre o atendimento de espíritos enfermiços: “[…] com a mediunidade esclarecida, é fácil aliviá-los e socorrê-los.”5 “[…] Reunamo-nos nas bases a que nos referimos, sob a inspiração do Cristo, Nosso Mestre e Senhor, e as nossas reuniões mediúnicas serão sempre um santuário de caridade e um celeiro de luz. ”4

Os livros do Espírito André Luiz, conhecidos como série Nosso Lar, esclarecem magistralmente os processos de libertação espiritual. Todavia, em Desobsessão estão disponíveis várias recomendações práticas para uma reunião: “O médium de incorporação, como também o médium esclarecedor, não podem esquecer, em circunstância alguma, que a entidade perturbada se encontra, para eles, na situação de um doente ante o enfermeiro. […] O esclarecimento não será, todavia, longo em demasia”.6

Deve ficar claro que os espíritos citados em vários locais empregam as expressões: espíritos enfermiços; como parentes nossos enfermos; doente ante o enfermeiro… O membro da equipe mediúnica que atua como dialogador tem um papel muito importante e os orientadores espirituais comparam-no a um enfermeiro ante um doente, referindo-se aos espíritos necessitados, como enfermiços, como se fossem parentes nossos enfermos… Ou seja, o tom da fraternidade deve prevalecer no diálogo com os espíritos necessitados de acolhimento, apoio e esclarecimento.

A resultante dos esclarecimentos espirituais nos remete a um episódio significativo. No dia 2 de abril de 2010, exatamente no dia do Centenário de nascimento de Chico Xavier, houve a inauguração do Memorial do Luiz Gonzaga, anexo a centro de mesmo nome, em Pedro Leopoldo, a terra natal do médium. Na oportunidade representamos o presidente da Federação Espírita Brasileira (FEB) e estavam presentes representantes da Municipalidade, Banda da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, dirigentes da União Espírita Mineira (UEM), Arnaldo Rocha, Oceano Vieira de Melo, Terezinha de Oliveira (de Campinas), parentes e amigos de Chico Xavier. No final da cerimônia assistimos a um fato inesquecível e emocionante: o mestre de cerimônias solicitou que abrissem uns engradados cobertos, que se encontravam cheios de pombas, e estas iniciaram voos. Em comentário do cerimonial, fez-se uma comparação ao voo livre das pombas, em um belo bailado aéreo: “[…] a libertação das almas iluminadas pelo Evangelho à luz do Espiritismo, que por aqui estiveram, ao se desprenderem do corpo físico”.3

Essa frase é muito marcante! O exemplo no bem persistente de Chico Xavier, o seu amor em ação, fizeram dele um valoroso intermediário para a libertação de almas.

Referências:

1) Livros pioneiros obtidos de gravações de psicofonias. Reformador. Ano 129. N.2.190. Setembro de 2011. P. 329-331.

2) Xavier, Francisco Cândido; Muszkat, Roberto; Muszkat, David. Quando se pretende falar da vida. São Bernardo do Campo: GEEM. 1983.

3) Carvalho, Antonio Cesar Perri. Chico Xavier. O homem, a obra e repercussões. Cap. 2.7. Capivari: Ed. EME. 2019.

4) Xavier, Francisco Cândido. Espíritos diversos. Instruções psicofônicas. Cap. 59. Rio de Janeiro. FEB.

5) Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito Emmanuel. Seara dos médiuns. Cap. 55. FEB.

6) Xavier, Francisco Cândido. Pelo espírito André Luiz. Desobsessão. Cap. 37. FEB.

Transcrito de:

Revista Internacional de Espiritismo. Ano XCIV. N.3. Abril de 2019. P.140-141.