Jorge Damas Martins
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“…Mostrou-lhes as suas mãos…” (Jo. 20:20)
Uma das páginas captadas pela antena sensível de Chico Xavier fala das mãos, não só como instrumento de serviços abençoados, mas como registro de quem somos, tanto perante a nossa consciência como também frente a comunidade cósmica.
Emmanuel é sábio em recordar o gesto de Jesus:
Reaparecendo aos discípulos, depois da morte, eis que Jesus, ao se identificar, lhes deixa ver o corpo ferido, mostrando-lhes destacadamente as mãos…
As mãos que haviam restituído a visão aos cegos, levantado paralíticos, curado enfermos e abençoado velhinhos e crianças, traziam as marcas do sacrifício.
Traspassadas pelos cravos da cruz, lembravam-lhe a suprema renúncia.
As mãos do Divino Trabalhador não recolheram do mundo apenas calos do esforço intensivo na charrua do bem. Receberam feridas sanguinolentas e dolorosas…[1]
O lúcido mentor relembra que o Cristo ressuscitado mostra aos seus representantes na Terra e continuadores de sua augusta missão, que não adianta desfraldar a bandeira da fé cristã, defender o Mestre com palavras inspiradas e de efeito, é imprescindível mostrar as mãos calejadas e sacrificadas na obra da caridade renovadora. O apóstolo Tiago compreendeu bem a atitude exemplar de Jesus: “Mostre-me a tua fé sem as tuas obras e eu te mostrarei a fé pelas minhas obras” (Tg. 2:18).
A palavra mão é de longe a parte do corpo humano mais citada na Bíblia: 1.538 vezes, sendo 1.153 como iad, palavra hebraica semelhante a iada, que significa conhecimento[2].
Emmanuel mostra ainda que o “coração inspira” o homem, pois nele está a sede da consciência espiritual. Daí partem todo o nosso pensar, falar e agir. Então, baseado na inspiração do eu profundo – continua o mentor de Chico Xavier -, o “cérebro pensa e as mãos realizam”. Cérebro e mãos formam uma parceria que se completam.
A experiência mostra que as mãos são reflexo e extensão fiel do nosso cérebro e, exprimem as interações dele com o meio externo. Jesus chega mesmo a falar em “saber” e “fazer”: “Não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita” (Mt. 6:3). Assim, a mão esquerda está ligada ao conhecimento e a direita a ação. É como comenta o já citado Evaristo Eduardo Miranda:
Existe uma correspondência entre a mão esquerda e o hemisfério direito do cérebro (sede da compreensão global, intuitiva ou afetiva). À mão direita corresponderia mais o hemisfério esquerdo (sede de nossas faculdades superiores como a dedução, a lógica, a linguagem e nossas manifestações voluntárias). (p. 178).
Então a ação, a obra ou a caridade, simbolicamente é representada pela “mão direita”. E, Allan Kardec, na máxima paulina do “fora da caridade não há salvação”[3], quer ensinar que fora da ação, da prática cristã não se evolui. Aliás, é o que IHVE – o deus bíblico (Jesus) – ensina a Jó: “Podes com a tua mão direita garantir-te a salvação” (Jó. 40:14).
Emmanuel prossegue falando agora sobre as mãos como imagens de liderança empreendedora e espírito de serviço: “Em toda parte, agita-se a vida humana pelas mãos que comandam e obedecem”.
E, no Antigo Testamento, a mão de Deus simboliza totalidade, poder e potência: “A minha mão fundou a terra, a minha mão direita estendeu os céus; eu chamo-os e todos juntos se apresentam” (Is. 48:13). No caso do ser humano a imagem é de que ele só pode fazer aquilo que está em suas mãos ou ao alcance de suas mãos. Inclusive, a sua inteligência faz com que as suas mãos se prolonguem nos instrumentos mais variados, em benefício do alívio do seu cansaço, na laboriosa luta da manutenção pela vida.
Mas, há homens que se utilizam das mãos para beneficiar e, há outros, que as fazem como instrumento de dano. Emmanuel prossegue:
Mãos que dirigem, que constroem, que semeiam, que afagam, que ajudam e que ensinam… E mãos que matam, que ferem, que apedrejam, que batem, que incendeiam, que amaldiçoam…
O Evangelho é rico de exemplos: Mãos que mataram as criancinhas de Belém (Mt. 2:16); mãos que degolaram João, o Batista, o Precursor do Cristo de Deus (Mt. 14:10); mãos que esbofetearam e chicotearam o Mestre (Jo. 18:22 e 19:1); mãos que apedrejaram Estevão (At. 7:58); mãos que compraram consciências para empanar o brilho da ressurreição (Mt. 28:12-13); etc.
Mas, há mãos que tocam em oração as criancinhas (Mt. 19:13), mãos que curam, como as de Ananias, tirando a cegueira de Saulo (At. 9:17-18); mãos que convocam os sete diáconos para o serviço cristão (At. 6:6); mãos que abençoam o início do apostolado de Paulo (At. 13:3); mãos que sustentam um aleijado curado, mas enfraquecido (At. 3:7); etc.
Mas, em todas as circunstâncias em que mãos abençoadas agiram nos Evangelhos, queremos destacar duas passagens:
1º) Mãos estendidas para a fraternidade e reconciliação: Havia um clima de divisão na igreja cristã nascente. A missão de Paulo e Barnabé entre a gentilidade era posta em dúvida na Casa do Caminho, em Jerusalém. Então, os apóstolos se reuniram em concílio e, rememora Paulo de Tarso: “E conhecendo a graça a mim concedida, Tiago, Cefas e João, tidos como colunas, estenderam-nos a mão, a mim e a Barnabé, em sinal de comunhão” (Gl. 2:9).
2º) Jesus é generoso com quem precisa da mão direita para se sustentar através do trabalho dignificante. É triste, principalmente numa sociedade injusta que não ampara os mutilados, vê-los esquecidos e desprezados. Isto porque eles não são vistos como produtores de bens materiais, mas apenas como prejuízos ao organismo social:
E aconteceu também noutro sábado, que entrou na sinagoga, e estava ensinando; e havia ali um homem que tinha a mão direita mirrada. E os escribas e fariseus observavam-no, se o curaria no sábado, para acharem de que o acusar. Mas ele bem conhecia os seus pensamentos; e disse ao homem que tinha a mão mirrada:
– Levanta-te, e fica em pé no meio. E, levantando-se ele, ficou em pé.
Então Jesus lhes disse: Uma coisa vos hei de perguntar: É lícito nos sábados fazer bem, ou fazer mal? salvar a vida, ou matar? E, olhando para todos em redor, disse ao homem: Estende a tua mão. E ele assim o fez, e a mão lhe foi restituída sã como a outra (Lc. 6:6-10).
Agora destacamos outro tema: Emmanuel vai nos surpreender com uma revelação que merece a mais profunda reflexão e análise: “Todos possuímos nas mãos antenas vivas por onde se nos exterioriza a vida espiritual”.
Reafirmemos: “antenas vivas nas mãos”. Ora, as mãos se elevam quando em oração; as mãos ficam espalmadas para cima quando da transmissão de passes, captando fluídos; as mãos acenam em gestos de fraterno cumprimento, exalando vibrações; etc. Porém, “antenas vivas nas mãos”, parece que a informação está indo longe demais … Não parece?
Mas, há muito mais coisas debaixo do sol que podemos imaginar …
Esta revelação do querido Emmanuel é de 1956, data em que foi publicado o livro Fonte e viva. Porém, cerca de dez anos antes, em 1945, a mesma informação já havia sido revelada na Úmbria abençoada por Francisco de Assis, através do apóstolo da nova era, o professor Pietro Ubaldi. Vejamos:
Observemos, para compreender melhor, este caso de sutilização da forma por meio de elaboração evolutiva, quer dizer, este caso de sensibilização e espiritualização. A princípio, e do ponto de vista biológico, a mão do homem foi um dos membros que o tronco produziu para facilitar a marcha, e isso já era a primeira manifestação de vontade interior dirigida para objetivo elementar. Depois, esse membro se destacou da terra e se transformou em órgão apreensor e instrumento de ação e de trabalho, como manifestação de vontade mais complexa e mais inteligente, embora presa ainda à forma material da estrutura ósseo-muscular, de que estava em estreita dependência. Hoje a mão se vai sempre transformando de instrumento físico em instrumento psíquico, vai tornando-se tentáculo nervoso cada dia mais ágil e sensível e passando de agente físico a órgão dirigente de outras energias, inclusive da muscular. Assistimos a um processo de desmaterialização, sensibilização e espiritualização, a que corresponde progressivo aumento de poder em extensão e profundidade. Continuando no mesmo caminho, a mão, gradativamente transformada de instrumento de marcha em órgão apreensor e, depois, em órgão diretor de forças, a mão se transformará em meio de recepção e transmissão de vibrações dinâmicas e psíquicas, antena para comunicar e receber energia e pensamento. Então, o poder interior do espírito terá podido aflorar de tal maneira da profundidade do ser que há de permitir ao homem comunicar-se e viver em comunhão com as infinitas energias do espaço.[4]
Por fim, vem então a mensagem de alerta do guia do nosso Chico Xavier: “Reflete, pois, sobre o que fazes, cada dia”.
Afinal, somos nós os construtores da nossa própria história e, é lógico, que as mãos realizam e, a memória registra para sempre na subconsciência. Tudo se fixa! E, depois, se desenrola no destino, que é a verdadeira releitura dos arquivos produzidos pelas mãos. Assim, para os que sabem ler, as linhas das mãos são fontes da história pessoal de cada um[5]. É pura quiromancia!
Aliás, é isso mesmo que ensina Emmanuel:
Não olvides que, além da morte, nossas mãos exibem os sinais da nossa passagem pela Terra. As do Cristo, o Eterno Benfeitor, revelavam as chagas obtidas na divina lavoura do amor. As tuas, amanhã, igualmente falarão de ti, no mundo espiritual, onde interrompida a experiência terrestre, cada criatura arrecada as bênçãos ou as lições da vida, de acordo com as próprias obras.
[1] Fonte viva, 6ª Ed. FEB, 11/1975, Rio de Janeiro (RJ). Capítulo: Reparemos nossas mãos, Lição nº 179, p. 397-398.
[2] Corpo – Território do Sagrado. Miranda, Evaristo Eduardo. Editora Loyola, 2ª ed., Agosto de 2.000, São Paulo (SP). Capítulo: As Mãos – A visão do conhecimento, p. 175.
[3] O Evangelho Segundo o Espiritismo. Kardec, Allan. 2ª Ed. FEB, Brasília (DF), 5/2013. Capítulo XV: Fora da Caridade Não Há Salvação.
[4] A Nova Civilização do Terceiro Milênio. Ubaldi, Pietro. 3º Ed. FUNDÁPU, Campos (RJ), 1984. Capítulo XV: O Tipo Biológico do Futuro, p. 179.
[5] A médium Sra. Cardonne, possuía “notável talento para ler nas mãos” e, numa sessão na residência do Sr. Roustan, fez uma “leitura” das linhas das mãos de Allan Kardec, em 6 de maio de 1857. Ver Obras Póstumas. Kardec, Allan. Segunda Parte: A Minha Iniciação no Espiritismo – A Tiara Espiritual. Trad. Evandro Noleto Bezerra, 1ª Ed. FEB, Brasília (DF), 08/2009, p. 373-374. Para maior conhecimento da técnica da “leitura” das mãos ver a obra do genial espírita Francisco Valdomiro Lorenz: Elementos da Quiromancia, Ed. Pensamento, MCMLXXI, São Paulo (SP).