Marchemos

Marchemos!

Há mistérios peregrinos

No mistério dos destinos

Que nos mandam renascer:

Da luz do Criador nascemos,

Múltiplas vidas vivemos, Para à mesma luz volver.

 

Buscamos na Humanidade

As verdades da Verdade,

Sedentos de paz e amor;

E em meio dos mortos-vivos

Somos míseros cativos

Da iniqüidade e da dor.

 

É a luta eterna e bendita,

Em que o Espírito se agita

Na trama da evolução;

Oficina onde a alma presa

Forja a luz, forja a grandeza

Da sublime perfeição.

 

É a gota d'água caindo

No arbusto que vai subindo,

Pleno de seiva e verdor;

O fragmento do estrume,

Que se transforma em perfume

Na corola de uma flor.

 

A flor que, terna, expirando,

Cai ao solo fecundando

O chão duro que produz,

Deixando um aroma leve

Na aragem que passa breve,

Nas madrugadas de luz.

 

Inda é a bigorna, o malho,

Pelas fainas do trabalho,

A enxada fazendo o pão;

O escopro dos escultores

Transformando a pedra em flores,

Em Carraras de eleição.

 

É a dor que através dos anos,

Dos algozes, dos tiranos,

Anjos puríssimos faz,

Transmutando os Neros rudes

Em arautos de virtudes,

Em mensageiros de paz.

 

Tudo evolui, tudo sonha

Na imortal ânsia risonha

De mais subir, mais galgar;

A vida é luz, esplendor, 

Deus somente é o seu amor,

O Universo é o seu altar.

 

Na Terra, às vezes se acendem

Radiosos faróis que esplendem

Dentro das trevas mortais;

Suas rútilas passagens

Deixam fulgores, imagens,

Em reflexos perenais.

 

É o sofrimento do Cristo,

Portentoso, jamais visto,

No sacrifício da cruz,

Sintetizando a piedade,

E cujo amor à Verdade

Nenhuma pena traduz.

 

É Sócrates e a cicuta,

É César trazendo a luta,

Tirânico e lutador;

É Cellini com sua arte,

Ou o sabre de Bonaparte,

O grande conquistador.

 

É Anchieta dominando,

A ensinar catequizando

O selvagem infeliz;

É a lição da humildade,

De extremosa caridade

Do pobrezinho de Assis.

 

Oh! bendito quem ensina,

Quem luta, quem ilumina, 

Quem o bem e a luz semeia

Nos combates do evolutir:

Terá a ventura que anseia.

Nas sendas do progredir.

 

Uma excelsa voz ressoa,

No Universo inteiro ecoa:

“Para a frente caminhai!

“O amor é a luz que se alcança,

“Tende fé, tende esperança,

“Para o Infinito marchai!”

Castro Alves

(Xavier, Francisco Cândido. Espíritos diversos. Parnaso de além túmulo. Marchemos. 1.ed. Rio de Janeiro: FEB)

Obs.: na versão original, o texto está grafado na ortografia vigente na época.